quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Aprendizado Crítico

Em uma terra distante, um desavisado leitor tinha, subitamente, a atenção sequestrada pela manchete do jornal em suas mãos. A chamada alertava sobre o domínio que um grupo de maconheiros estaria exercendo sobre uma das mais importantes universidades de seu país. Apesar de ter visto algo a respeito, en passant, sua escassez de tempo crônica o impedira de se inteirar sobre o assunto. Dessa vez, não. Decidiu-se seguir com a leitura e soube que uma das principais motivações daquela crise havia sido a permissão para que a divisão militar de policiamento do estado, ao qual a universidade estava subordinada, voltasse a ter livre acesso para atuar ostensivamente dentro dos campi da instituição. A decisão, respaldada pelo voto da maioria em assembleia discente, não havia sido acatada por uma minoria que parecia não se preocupar com a crescente onda de criminalidade no campus principal.

Sem conseguir ler mais nada, fechou o jornal, respirou fundo e se pôs a refletir sobre toda aquela confusão. As ciências humanas haviam lhe ensinado que aquela universidade era um símbolo de luta e resistência contra os regimes autoritários cuja força, poucas décadas atrás, havia subjugado seu país. Tinha ciência de que não havia sido fácil retornar à condição de normalidade democrática anterior aos golpes e que aquele afastamento das forças militares visava, de forma objetiva, manter aquela conquista tão valiosa, evitando que futuras manifestações, contrárias à autoridade vigente, pudessem ser facilmente sufocadas pela força policial. Estranhou que a simples exigência de uma autorização por escrito do reitor, para que qualquer movimentação militar ocorresse na universidade, tivesse sido descrita como uma 'ultrapassada proibição de acesso' no texto que acabara de ler.

Havia aprendido, com as ciências exatas, a quantificar suas ideias e impressões, ensinamento que, agora, parecia-lhe insuficiente para compreender o equacionamento que faziam daqueles problemas. Aquela universidade, sozinha, administrava um orçamento tão vultoso quanto os das maiores cidades do país e, mesmo assim, nenhum investimento significativo na segurança interna de suas instalações havia sido feito, ou sequer proposto, pela reitoria, ou pelo governo do estado, para conter os crescentes índices de violência a que aquela comunidade estudantil vinha sendo submetida. Além disso, não conseguia se lembrar de qualquer outra instituição de ensino, pública ou privada, que tivesse necessitado da constante presença de homens da segurança pública para garantir a segurança de seus alunos e professores.

Já no trabalho, chegou a comentar algo a respeito do assunto com seus colegas, mas foi logo tachado de defensor da 'marcha da maconha' na universidade. Incrédulo com a reação dos demais, lembrou-se que as ciências biológicas o haviam ensinado que nem todo embrulhar de estômago possuía origem orgânica...