segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Passe Adiante!


No sábado, um filme que há tempos pensava em assistir estava disponível para locação, escondido entre outros mais antigos em uma das estantes. Havia um único exemplar e, desta vez, não hesitei e levei-o. O aspecto meio de "Sessão da Tarde" da capa e do título disfarça um excelente drama com nomes como Haley J. Osment, Kevin Spacey e Helen Hunt, além de uma rápida participação do cantor Jon Bon Jovi.

"Pay it Forward" (2000), ou "Corrente do Bem", no Brasil, baseia-se no livro de Catherine Ryan Hyde que conta a história de Trevor McKinney (Osment), um garoto de 12 anos que, ao receber um dever de casa de seu professor de Estudos Sociais, Eugene Simonet (Spacey), leva a proposta a sério e acaba inventando um método relativamente simples para melhorar o mundo. Inicialmente, sua ideia parece inócua, mas acaba tomando dimensões surpreendentes, muito além do que poderia imaginar.

Sua proposta era de que se ajudasse três pessoas e, ao invés de receber algo em troca, solicitasse a elas que fizessem o mesmo com outras três, o número de pessoas ajudadas cresceria em uma progressão geométrica, fazendo com que o mundo inteiro logo melhorasse. Começa ajudando um um sem-teto, dando-lhe de comer e roupas para que pudesse conseguir um emprego. Mesmo achando ter falhado, sua ideia se espalha, atingindo outras cidades, até que um repórter, incrédulo de que havia sido beneficiado desinteressadamente, vem ao encalço da história até chegar a Trevor.

O filme faz uma crítica à inércia que adquirimos face ao tamanho das dificuldades enfrentadas quando se tenta mudar uma situação ruim. Ao desistirmos de agir, conformando-nos, acabamos por contribuir ativamente para que nada melhore, gerando um ciclo vicioso. Com a ideia de agir localmente, pensando globalmente, a história mostra que mesmo pequenas ações são capazes de gerar efeitos significativos nas vidas de nossos semelhantes, frequentemente, devolvendo-lhes a esperança e dando origem a um ciclo virtuoso de cooperação.

Assista e se achar que a ideia é, realmente, interessante, passe adiante!

domingo, 29 de novembro de 2009

Quintessência, o livro.


Quintessência¹ é o título de um romance ficcional, escrito por Flávio Medeiros Jr. e publicado em 2004 pela Editora Monções. O autor é um médico mineiro que, segundo suas próprias palavras, preferiu ser médico e escrever como "hobby" à ser escritor e exercer a medicina como "hobby", já que a última opção poderia dar cadeia.

Apesar de se ambientar neste século, o enredo, de estilo policial, desenrola-se em um futuro próximo em meio a atentados terroristas, aparentemente sem um propósito definido, que desafiam a inteligência da "Polícia Unificada" e, em especial, de um de seus agentes, Tom Rizzatti. Isto porque os ataques parecem sempre deflagrados pelo mesmo homem que, morrendo ao final de cada um deles, sempre ressurge, misteriosamente, para outro ato de terror absolutamente inesperado.

O cenário principal é a capital mineira, Belo Horizonte, e o leitor que a conhece terá a estranha sensação de vislumbrá-la no futuro através dos olhos críticos do autor. O futuro de outras cidades brasileiras, como Rio de Janeiro e São Paulo, também fazem parte da trama, extremamente bem engendrada e capaz de cativar até os leitores que não morrem muito de amores por ficção científica. Além disso, a dinâmica da história é peculiar, começando despretenciosamente e acelerando a altíssimas velocidades em seus momentos finais.

Conheci o Flávio mais ou menos na época do lançamento do seu livro — inclusive adquiri o meu exemplar diretamente das mãos dele, com dedicatória e tudo! — e confesso ter lido o romance motivado mais pela pessoa espetacular do autor do que pela expectativa com relação ao texto. Afinal, romances policiais de ficção científica não é, propriamente, meu estilo preferido de leitura. Mas, ledo engano! O romance é ótimo em todo seu conjunto, principalmente no seu final surpreendente!

O autor escreve por amor à arte e seus textos vêm ganhando espaço no Brasil e no mundo. Recentemente, um de seus trabalhos foi selecionado para integrar o livro "Steampunk²: Histórias de Um Passado Extraordinário", de autoria coletiva, e outro, de mesmo gênero, lançado em Portugal.

E se você se despir dos preconceitos literários, talvez também se surpreenda com a história, com o autor e até consigo mesmo ou consigo mesma...


¹ Quintessência ainda pode ser encontrado na Livraria Leitura.

² Steampunk é um subgênero da ficção científica no qual a história, ambientada no passado, apresenta certos paradigmas tecnológicos atuais como se tivessem surgido anteriormente, a partir dos meios disponíveis à época, como, por exemplo, computadores de madeira e aviões a vapor.

sábado, 28 de novembro de 2009

Herói


"Lá, caído, parecia não querer acreditar que havia sucumbido novamente. Sentia-se já sem forças, humilhado, deprimido e sem esperanças. Pensava, dessa vez, ter mapeado todas as possibilidades, considerado adequadamente os riscos e adotado a melhor estratégia, mas estava errado mais uma vez.

Pensou no fim e nem poderia pensar em algo diferente. Desistir, naquele momento, era, sem dúvida, a alternativa mais sensata, depois de tudo que passara. Mas antes era preciso convencer a própria consciência, a única coisa em si que se recusava a aceitar passivamente aquela situação.

Reuniu forças e moveu o rosto em direção ao céu. Estava escuro, sem estrelas ou luar, nem parecia ter aberto os olhos. O desânimo e o cansaço se misturavam às dores por todo o corpo e não quis mover mais nada. Seu desejo era de que alguém desse um término para tudo aquilo, ali mesmo e naquele momento. Bastava de dor, frustração, humilhação e sofrimento. Queria o paraíso, se houvesse algum, ou apenas o silêncio do fim, mais nada...

Lembrou-se vagamente de uma conversa que teve momentos antes de sua derradeira queda e se revoltou. Como alguém lhe poderia considerar como herói de alguma espécie, colecionando aquele sem número de derrotas, uma após a outra? Lamentou-se mais uma vez e cerrou os olhos de novo.

Ocorreu-lhe, então, que não dariam a ele o fim que desejava e que portanto teria apenas duas opções: permanecer ali ou levantar-se mais uma vez. Respirou fundo, fingiu não sentir todas as dores que sentia, buscou forças de onde achava que não tinha e se levantou só por mais esta vez.

Sacudiu a poeira, olhou para a frente e continuou a caminhar..."


sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Identificação Projetiva


Já há algum tempo que, por experiência própria, cheguei a uma conclusão: nada que está externo a nós mesmos tem o poder de nos atingir emocionalmente. Eu sei... A afirmação é absolutamente polêmica! Mas, se lhe conforta saber, apesar de eu ter chegado a essa conclusão por conta própria, a ideia não é minha nem tampouco original. Os monges budistas meditam sobre ela há séculos! Além disso, há vários outros profissionais capacitados estudando a matéria de forma sistemática e muito mais séria do que este que lhe escreve.

É o caso de uma corrente psicanalítica, a Trilogia Analítica, coordenada por um médico psiquiatra uspiano chamado Norberto Keppe, que, dentre muitas outras coisas, estuda este fenômeno a que chamam de "projeção". Segundo eles, o fato de nos emocionarmos com algo externo decorre de uma identificação do próprio indivíduo com a pessoa ou situação em questão. Quando nos irritamos com alguém parado à nossa frente, por exemplo, é porque "lembramos" que somos lerdos, ou negligentes com os imprevistos do caminho, ou que não avançamos — mesmo na vida — na velocidade que gostaríamos, etc. Ao não admitirmos nossas próprias limitações, estas são censuradas pelo ego e projetadas na pessoa à nossa frente. Não acredita?! Então substitua a pessoa à sua frente por uma parede e reavalie sua irritação. Você se desviaria dela, simplesmente, ou teria ímpetos de socá-la?

Recentemente, lendo um destes informes corporativos enviado por um amigo meu, deparei-me com um trecho interessante, sobre como se manter saudável: "And don’t try to fix other people. Stare at your reflection when the shortcomings of others aggravate you." (algo como: "E não tente consertar as outras pessoas. Encare seu reflexo quando as limitações dos outros lhe irritarem."). A despeito do estilo "auto-ajuda" do texto, é inegável que os autores alemães, Kustenmacher e Seiwert, que nada têm de psicanalistas, acabaram se referindo ao mesmo problema e de uma forma muito similar à descrita pelo modelo psicanalítico. É bem provável, portanto, que minha polêmica conclusão não esteja, assim, de todo equivocada.

Acontece, entretanto, que o modelo, apesar de simples, é muito difícil de ser aceito por demandar da pessoa uma considerável pré-disposição em compreendê-lo. Não é nada trivial inverter o ônus de uma situação que nos aborrece, mas talvez seja mais viável — e didático — fazer isso com alguma outra que nos emocione positivamente, já que o mecanismo é o mesmo.

Sabe quando nos emocionamos? Quando dá aquele nó na garganta ao ver seu trabalho reconhecido ou saber da história de luta de alguém? Pois bem, se a hipótese for correta, a emoção positiva também decorrerá de uma identificação de algo presente no indivíduo com a outra pessoa ou situação externa. Assim, se tiver a oportunidade de vivenciar tal situação, ou mesmo se lembrar de alguma, procure identificar as virtudes, na pessoa ou na situação, que deram origem a essa comoção, tais como coragem, desprendimento, garra, altruísmo, etc. E talvez perceba que muitas dessas qualidades, se não todas, também são suas. Por isso da emoção com a outra pessoa ou situação...

Mas, por favor, só depois disso, tente o mesmo exercício com as situações que lhe frustram. Há uma vantagem que, se obtiver sucesso neste segundo nível, é bem provável que as tensões geradas no dia-a-dia diminuam, a medida que vai-se tomando consciência das próprias limitações — mesmo que não as admita para mais ninguém! Afinal, corrigir-se, apesar de difícil, é algo possível. Diferente de tentar convencer uma "porta" que ela está no lugar errado...

Bom, há desvantagens também, mas elas se resumem na coragem necessária para encarar as próprias limitações, justamente tão bem projetadas no outro pelo ego. Lembra?!



quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Recicle-se!


Bom, é bem verdade que o poder público ainda não dá toda a atenção devida ao problema do lixo gerado nas grandes cidades. São Paulo, por exemplo, a maior da América Latina, está longe de implementar um sistema adequado de coleta seletiva que atenda a toda cidade. Mas, claro, nada disso é justificativa para que os cidadãos não cumpramos com a parte de contribuição que nos cabe.

Se você não tem o costume de pelo menos separar os recicláveis do lixo orgânico, talvez uma experiência lhe dê uma boa ideia do que andamos fazendo com a natureza. Proponho um desafio: durante uma semana, separe o lixo de sua residência em recicláveis (plástico, papel, vidro e metal) dos não-recicláveis (lixos da cozinha e do banheiro). Ao final do período, avalie os dois volumes e perceba o quanto de "lixo" está indo para o aterro sanitário (os dois volumes) em comparação com o quanto deveria ir (apenas os não-recicáveis). Você vai se surpreender...

Agora, mesmo se não gostar de matemática, olhe para os dois volumes e multiplique por vinte milhões, que é a quantidade de pessoas na Grande São Paulo, gerando, mais ou menos, a mesma quantidade de detritos que você — só um detalhe para lhe ajudar nas contas: são necessários cerca de três dias, ininterruptos, para contar de um até um milhão. Parece fácil concluir, então, que no ritmo atual não haverá mais espaço para aterros sanitários daqui uns poucos anos. Mesmo porque nosso velho lixo, enterrado há algumas décadas, ainda não deve estar totalmente degradado pela natureza nos aterros mais antigos.

E mesmo que você não esteja nem aí com o meio-ambiente, pelo menos faça um pequeno favor aos seus descendentes e semelhantes que, aqui, permanecerão depois que você se for: colabore para manter o planeta sustentável. Cobre do seu governo local, reduza seu próprio consumo de supérfluos, destine os recicláveis que gera a alguma cooperativa ou ONG, evite pegar sacolinhas plásticas sem real necessidade — leve sacolas de casa! —, enfim, faça alguma para ajudar. Qualquer coisa, por mais insignificante que possa parecer, ajudará — se não na quantidade, pelo menos no exemplo.

Além do planeta, os descendentes, seus e de seus amigos, que aqui estarão no futuro, desde já, agradecem!

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Atuais Limites da Conceituação Humana


Muita coisa está bem além da nossa capacidade de compreensão. É fato. Se a realidade se resumisse ao que nós conhecemos dela hoje, estaríamos condenados à eterna estagnação da inteligência. Afinal, qual seria o propósito do aprendizado, da evolução e do desenvolvimento se já soubéssemos tudo? E, neste sentido, a ignorância, o não-saber, é uma bênção pois nos permite aprender, evoluir e se desenvolver. Hoje em dia, o volume de conhecimento da humanidade praticamente dobra a cada dois anos, velocidade que vem aumentando exponencialmente. Mesmo assim, sequer experimentamos uma pequena fração de tudo o que existe. Portanto, há muito — mas muito mesmo! — o que se aprender.

Compreendemos o mundo a nossa volta, unicamente, através de nossos sentidos e de nossa racionalidade. E, como cada um de nós é um ser único, parece evidente que cada pessoa possua a sua própria visão, única e exclusiva, do que está ao seu redor. Alguém que nasça cego, por exemplo, terá uma "visão" de mundo bastante diferente de outra pessoa que enxergue ou que já tenha enxergado em algum momento da vida. Similarmente, um indivíduo que tenha nascido com uma mutação genética que lhe permita enxergar mais cores do que é possível às pessoas comuns, também terá uma percepção diferente da realidade.

O que muito pouca gente compreende, entretanto, é que um cego de nascença terá, muito provavelmente, um conceito do que seria a cor vermelha, por exemplo, simplesmente porque foi educado por pessoas que conseguem identificá-la. Ao contrário, o mutante que enxerga uma cor extra, talvez chegue à fase adulta sem enxergá-la, simplesmente porque foi educado por pessoas que não conseguem identificá-la. Portanto, a existência, ou não, da cor e das evidências relacionadas, dependem, exclusivamente, do indivíduo e de mais ninguém.

Foi para minimizar essa relatividade das percepções que se desenvolveu um método, o científico, para permitir um compartilhamento, sistemático, de informações sobre os fenômenos observáveis em cada um desses diferentes "mundos". Segundo este método, um mesmo evento só será considerado causal se, e somente se, puder ser previsto através de um modelo lógico, em geral matemático, possível de ser compartilhado entre vários indivíduos. O fato disto não se aplicar a um determinado evento, entretanto, em absolutamente nada implica na ocorrência do fenômeno em si. É apenas uma maneira de classificar, organizar e compreender o universo de uma forma compartilhada.

Grosso modo, funciona assim: alguém inventa um modelo explicando como algo funciona. Esta "invenção" implica em uma série de consequências que, segundo o método, devem ser observáveis para serem válidas. Se as consequências previstas acontecem de fato, a "invenção", ou teoria, é considerada válida. Caso alguma consequência observada seja diferente daquelas previstas, a teoria está errada — ou é válida apenas em determinadas condições. Necessariamente, outra teoria terá de ser inventada para explicar, também, a exceção.

Um dos campos mais férteis para novas teorias é a Astrofísica, talvez porque o que se observa seja, normalmente, inatingível. Este ramo da ciência usa e abusa da metodologia científica, acima descrita, como ferramenta para o avanço de suas descobertas. Foi assim com a teoria do "Big-Bang", cujo nome, aliás, fora dado pelo astrônomo britânico Fred Hoyle, ironicamente, em uma tentativa de ridicularizá-la.

Em 2005, outro britânico, Simon D. M. White, diretor do Instituto Max Planck de Astrofísica da Alemanha, e sua equipe divulgaram os resultados obtidos em uma monstruosa simulação de computador chamada de "The Millennium Simulation Project" (algo como "Projeto Simulação do Milênio"). O projeto ocupou totalmente o supercomputador do instituto por mais de um mês, simulando, com base nas mais sofisticadas teorias,  a distribuição de matéria em uma região cúbica, com mais de dois bilhões de anos-luz de lado, a partir do monitoramento de mais de dez bilhões de partículas. Foram mais de 25 Terabytes (1 Terabyte = 1024 Gigabytes) em dados de saída, recriando a evolução das mais de 20 milhões de galáxias e dos buracos-negros superdensos que, ocasionalmente, provêm de energia o núcleo dos quasares — abreviação de quasi-stellar radio source: corpos pontuais com forte desvio para o vermelho, maiores que uma estrela e menores que uma galáxia, cujo núcleo, altamente energético, emite ondas de rádio e luz visível. Quem tiver curiosidade, a página do Max-Planck-Institut für Astrophysik exibe uma vasta quantidade de informações a respeito do projeto, incluindo publicações e filmes obtidos com a simulação.

O objetivo do projeto era o de comparar seus resultados com o que é observado, hoje, em nosso universo, buscando coerências ou incoerências nas teorias mais aceitas. A principal dificuldade decorreu da compreensão sobre a energia escura, supostamente responsável pela expansão do universo e que parece se comportar, mais ou menos, como a constante cosmológica presente no equacionamento de Einstein em sua Teoria Geral da Relatividade. Entretanto, se confirmada esta semelhança de comportamentos, ninguém saberia explicar o que isto significa fisicamente. Está, pelo menos por enquanto, um estágio além da conceituação humana.

Mas se você não entendeu patavina, talvez conhecendo a preocupação de White fique mais simples. Segundo ele, os estudos estão muito próximos de um beco sem saída e sem uma ideia realmente inovadora — como a da mecânica quântica no início do século passado — nem maciços investimentos em novos equipamentos serão capazes de resolver o problema.

Assim, esse atual limite da conceituação humana serve para nos mostrar que, apesar de haver coisas muito além de nossa compreensão, isto não as faz inexistentes. E é justamente a crença do ser humano no que ainda há para se descobrir, mesmo sem evidências imediatas, que faz desse limite, quase sempre, temporário. Afinal de contas, o método científico é apenas um método. Não?!


terça-feira, 24 de novembro de 2009

Patenteando a Ética


No dia 04/09/2009, o caderno de Ciências da Folha de São Paulo trouxe uma matéria sobre a recente descoberta de anticorpos capazes de neutralizar, de forma eficaz, boa parte das linhagens disponíveis do virus HIV, o que aumentaria as esperanças no desenvolvimento de uma vacina contra a AIDS. Acontece que o método para a descoberta dos anticorpos se baseou no recolhimento e análise do sangue de 1800 soropositivos no mundo. As amostras que apresentaram reação mais eficiente contra o virus foram separadas, isolando-se, posteriormente, os dois anticorpos que conseguiam atacar o HIV. Como ambos pertenciam à amostra de sangue de um mesmo doador africano, quais seriam seus direitos sobre a patente de uma eventual vacina comercial contra a AIDS?

A questão é colocada por uma análise que se segue à matéria, relembrando um caso semelhante ocorrido na Califórnia, EUA, onde a Suprema Corte decidiu que um paciente não tinha direitos sobre as células do próprio corpo extraídas, sem seu pleno conhecimento, por um médico que acabou patenteando uma das linhagens para criar um tratamento comercial contra o câncer. Os juízes, temendo prejudicar o avanço da medicina dando ganho de causa ao paciente, acabaram evidenciando ainda mais as limitações do atual sistema de patentes, já que o efeito gerado foi, justamente, o oposto ao pretendido. Isto porque, atualmente, segundo o texto, é cada vez mais comum cientistas abandonarem as pesquisas em uma área assim que algum colega registra alguma patente, evitando terem de pagar royalties e dividir os lucros.

O problema de bioética atinge não só indivíduos, como nos exemplos médicos citados acima, mas também países. Não são poucos os casos de registros, frequentemente obtidos por pessoas ou instituições em nações desenvolvidas, envolvendo espécimes, animais e vegetais, endêmicas de regiões pouco exploradas nos países em desenvolvimento. Então, o quão legítimo — se é que há alguma legitimidade — seria o direito à propriedade intelectual sobre elementos naturais?

Dada a velocidade dos avanços científicos, principalmente na área da bio-genética, é cada vez mais necessária uma ampla discussão a respeito do atual sistema de patentes — como sugerido, inclusive, na postagem "Partidos Piratas" — já que, além da eficiência do modelo, também sua legitimidade tem sido, seguidamente, colocada em xeque. Não parece razoável, em uma lógica democrata, que interesses particulares, de grupos ou indivíduos, sejam colocados acima daqueles relevantes para toda a coletividade.

Oxalá não exijam que registremos a patente de nossos próprios organismos futuramente...


segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Madeira Lunar


Justo no aniversário de 40 anos da Missão Apolo 11, conhecida por conduzir os primeiros seres humanos à Lua, uma história um tanto pitoresca acabou vindo à tona. Em agosto deste ano, o Museu Nacional Holandês — lar de obras-primas de mestres como Hals, Vermeer e Rembrandt — anunciou que a suposta pedra lunar, presenteada ao então primeiro-ministro holandês, Willen Drees, era, na realidade, um pedaço de madeira fossilizada. O presente teria sido entregue pelo embaixador estadunidense na Holanda, William Middendorf, e pelos astronautas em pessoa, Neil Armstrong, Michael Collins e Edwin Aldrin, no ano de 1969, após retornarem do espaço.

Às vésperas da década de 1970, os Estados Unidos da América alardeavam diante do mundo todo o sucesso da viagem empreendida à Lua e chegaram a presentear centenas de países com amostras de rochas lunares. Não seria nenhum disparate, portanto, imaginar que, principalmente naquele ano, uma "pedra" presenteada por autoridades norte-americanas à uma autoridade holandesa, fosse uma valiosa amostra de rocha lunar. Não era! Tivesse um cidadão qualquer aprontado algo similar e ido servir como testemunha de defesa em um tribunal, as chances do réu se safar seriam parecidas com as de se acertar algumas vezes seguidas na Megasena acumulada. Mas, em se tratando dos Estados Unidos da América, o fato só deve servir de mais alimento para teóricos da conspiração...

"Micos" à parte, a história é mais um excelente exemplo para evidenciar como a compreensão dos fatos, frequentemente, depende das expectativas e intenções de cada um, principalmente no que se refere às relações humanas. Mesmo que em momento algum fosse mencionado o fato de se tratar de uma amostra de rocha lunar, a razão e o bom senso empurravam o entendimento nessa direção, por mais absurdo que isso viesse a se mostrar depois. Se era um fóssil "especial" por algum outro motivo, entretanto, é provável que ninguém nunca mais saiba.

Assim, mesmo quando tudo for logicamente claro, lembre-se de que muitas vezes o que parece, nem sempre é...



domingo, 22 de novembro de 2009

Cinco, Quatro, Três, Dois, Um...


Se sua vida estivesse prestes a terminar, se lhe restasse apenas alguns poucos instantes neste mundo, de quais momentos se lembraria? Daquele minuto em que tomou consciência de que não daria tempo para terminar o relatório ou dos segundos em que abraçou um ente querido? Das horas que passou sem dormir por causa daquele compromisso profissional ou daquela fração de segundo de autêntica felicidade entre amigos? Dos dias que passou emburrado por causa de uma discussão inútil no trânsito ou do instante exato em que sentiu aquele frio na barriga ao ver a pessoa amada?

A escassez de tempo é uma ótima professora para quem não sabe como priorizar as coisas. Ao aumentar a velocidade do carro, por exemplo, pode-se perceber facilmente como a displicência dá lugar, automaticamente, à atenção focada no que é mais importante ao longo do percurso. O problema é que a velocidade vicia e só quando se para, eventualmente, é que se percebe a infinidade de detalhes importantes perdidos pelo caminho.

É óbvio que a vida profissional e os compromissos sociais são muito importantes, ou ninguém se ocuparia deles. Mas há inúmeros outros aspectos da vida pessoal tão ou mais importantes sendo, muitas vezes, negligenciados. Talvez uma conversa tola em uma roda de amigos, talvez o prazer de ter lido um determinado livro, talvez um simples sorriso arrancado às pressas do rosto de alguém... Coisas que, racionalmente, jamais seriam priorizadas face a uma reunião de trabalho mas que, sem dúvidas, marcam profundamente o espírito de quem as vive.

E foi em uma dessas conversas sem importância que minha querida prima me lembrou disso, dizendo que serão momentos assim que provavelmente relembraremos nos últimos cinco segundos de vida. E provavelmente, todo o resto é maya, como diriam os hindus, ou uma vã tentativa de se alcançar o vento, segundo os cristãos...

sábado, 21 de novembro de 2009

A Maldição das Entrelinhas


Talvez você ainda não tenha percebido, mas a maioria das pessoas fala, pelo menos, duas línguas. A segunda língua, entretanto, não é um idioma convencional, desses que se pode aprender em escolas. É uma linguagem sutil, misteriosa, indireta que é empregada simultaneamente à primeira língua usada pela pessoa. Além disso, sua comunicação pretende uma certa telepatia por demandar elementos subjetivos tanto daquele que fala quanto daquele que ouve, sendo essenciais à correta compreensão da informação.

Acontece, no entanto, que justamente por não trazer explicitamente o que se quer dizer, a segunda linguagem, oficialmente, não existe. Tem um caráter quase quântico, por comunicar vários sentidos ao mesmo tempo e, como tal, quando sua atenção se volta para qualquer um deles, os outros desaparecem. Há quem tente classificá-la como uma figuras de linguagem, hipocrisia ou mentira, mas essa comunicação não se enquadra em nenhuma dessas definições por um motivo muito simples: estas classificações fazem referência direta ao objeto a ser comunicado: as figuras de linguagem aos pontos implícitos, o hipócrita a algo que não pensa ou sente e a mentira, obviamente, ao oposto da verdade. Todas são lógicas e possuem elementos objetivos utilizados na sua compreensão, bem diferente da misteriosa linguagem das entrelinhas.

Tome como exemplo uma inocente saudação no escritório: "Oi, tudo tranquilo!?". Apesar de muito simples, a frase pode guardar em si desde uma ácida crítica à pró-atividade de quem escuta até um sincero elogio pela superação de um difícil obstáculo. Tudo dependerá da combinação de humores entre os interlocutores, do nível de tensão do ambiente, dos eventos recentes, da presença de outras pessoas, da temperatura, da luz do sol, do ar, do barulho do bebedouro... Seria um ótimo objeto de estudo para a Teoria do Caos, já que um piscar de olhos diferente é capaz de desencadear uma reação em cadeia suficiente para mudar completamente o sentido da saudação, originando, talvez, uma catástrofe nos relacionamentos dos que estão ao redor. Agora, imagine o que se passa em diálogos mais elaborados...

Mas, diferente das figuras de linguagem, da hipocrisia, da mentira, etc., não há elementos objetivos para se detectar a informação a ser passada. Isto porque, se quem ouve resolver questionar a validade de qualquer um dos supostos significados, quem fala, muito provavelmente, não confirmará — afinal, se tivesse disposto a fazer isto, teria falado expressamente na primeira oportunidade. Assim, imerso em dúvida, quem ouve escolhe o significado que deseja adotar e a linguagem das entrelinhas permanece inexistente! Com o tempo, as pessoas foram introjetando este comportamento e, hoje, escolhem o ângulo de compreensão automaticamente.

No geral, os orientais, em especial os japoneses, possuem uma compreensão mais cartesiana dos discursos, o que acaba gerando frequentes problemas de comunicação e, por causa disto, acabam sendo taxados de rudes e insensíveis. Os advogados criminais mais tarimbados, por exemplo, sabem que é melhor evitá-los no corpo de jurados quando a intenção é emocionar o júri. Obviamente, a não-identificação emocional com o caso se deve, não à insensibilidade, mas à compreensão mais objetiva dos fatos. Sem a habilidade de compreender bem a língua das entrelinhas, boa parte do apelo emocional acaba sendo perdido em meio a comunicação.

Esteja consciente, portanto, que enquanto não for fluente no idioma das entrelinhas, estará fadado ao fracasso nos seus relacionamentos interpessoais. Isto porque ao dizer qualquer coisa, mesmo sem a menor intenção, estará sempre enviando um misterioso recado àqueles que a compreendem bem. É uma verdadeira maldição...

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

O Mito da Democracia Racial Brasileira


A história do negro no Brasil está intimamente ligada à escravidão. Aliás, não apenas no Brasil, mas em boa parte do mundo ocidental. O continente, onde, supostamente, surgiu a raça humana, viu o sangue, o suor e as lágrimas de seus filhos serem espalhados pela Terra ao longo de séculos.

O horror da escravidão, entretanto, está longe de ser uma exclusividade da raça negra. Muito tempo antes, a história humana já carregava este câncer. Era costume fazer de escravos membros de outros povos subjugados em guerras, de castas inferiores do próprio povo ou até de cidadãos livres que não conseguiam pagar suas dívidas. Hebreus no Egito, gregos em Roma, índios na América do Sul, enfim, a escravidão nunca discriminou ninguém: brancos, negros, amarelos, vermelhos, homens, mulheres, crianças, novos, velhos, cristãos, pagãos, etc. Ainda hoje, há milhões de pessoas submetidas ao trabalho escravo, apesar desta “instituição” não ser mais aceita pela sociedade moderna.

E se atualmente a escravidão é velada, talvez por isto, seja até mais perigosa. Dê uma rápida olhada ao seu redor — no trabalho, na escola, na igreja — e verifique o número de pessoas reféns do atual sistema econômico. Sem condições para se formar adequadamente, recebem pouco pelo seu trabalho. Por receberem pouco, não podem nem melhorar sua formação nem poupar para tentar abrir um negócio. Sem poder empreender ou melhorar sua formação, continuam recebendo pouco e, assim, sucessiva e viciosamente. Claro, há exemplos de pessoas que saíram de situações semelhantes e obtiveram um sucesso invejável, como o Sílvio Santos e o Lula, por exemplo, mas são exceções, não a regra. Na maioria dos casos, se o cidadão parar para pensar, morre de fome...

Mas se hoje, então, a discriminação é econômica, atingindo qualquer raça, por que tantas medidas afirmativas tomadas em prol da população negra no Brasil?

Esta foi uma das questões mais contundentes surgidas, principalmente, no período que antecedeu a instituição da política de cotas no Brasil. E a força desse questionamento vinha da verdade que arrastava consigo, pois, de fato, neste século, a discriminação mais evidente no país é a econômica e não a racial. Sem mencionar a crença de que, políticas deste tipo ressaltam o que se quer amainar e fomentam ódio entre os não-negros que por vezes se sentem injustiçados por causa delas.

Durante uma entrevista para a Revista Caros Amigos em dezembro de 2002, Hélio Santos, um dos principais vetores do movimento negro no Brasil, lembrava do silêncio que se seguia ao perguntar o que os intelectuais, que se colocavam contra a política de cotas, sugeririam como alternativa para minimizar a insignificante presença de pessoas negras nas universidades brasileiras. O silêncio denunciava, dentre outras coisas, a falta de disposição para se pensar seriamente no problema.

Mas a realidade que poucos queriam enxergar, entretanto, é que o percentual de negros no país não se reflete nos vários extratos sociais. Ou seja, se não existisse qualquer discriminação na sociedade brasileira, estatisticamente, o percentual de negros na elite econômica e intelectual do país deveria ser bem maior do que é, efetivamente, hoje. E isto, portanto, faz com que as medidas afirmativas, entre elas as cotas, sejam absolutamente justificáveis, pelo menos até que tal discrepância deixe de existir.

Se atingiremos uma verdadeira democracia racial no Brasil, apenas as gerações vindouras serão capazes de dizer. Por enquanto, cabe-nos congratular a raça negra pela sua força e tenacidade secular e esperar pelo dia em que seus próprios descendentes reclamem a extinção dessas políticas pela mera falta de necessidade.



quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Ommmmmm...


Ontem o Palmeiras, praticamente, deu adeus às chances de vencer o campeonato brasileiro. O problema é que um dos principais motivos não foi a mera falta de "futebol", mas uma cena de violência gratuita entre dois de seus próprios jogadores. Uma pergunta interessante a se fazer é: alguém duvida de que ambos tinham exatamente o mesmo objetivo, o de ganhar o jogo? Entretanto, mesmo com objetivos iguais, o resultado foi o que se viu: duas expulsões, a derrota de toda a equipe e milhares de torcedores descontentes.

Com exceção de casos clínicos, o que geralmente leva duas pessoas a entrarem em conflito direto é a falta de compreensão de um com relação ao outro. Isto porque ambos acham que estão com a razão ou, simplesmente, não agiriam da forma como agem ou pensariam da forma como pensam. Mesmo um criminoso acredita, na sua lógica distorcida, que está agindo corretamente (entenda-se "corretamente" como "justificável" ou "melhor alternativa disponível")! E, assim, como o compartilhamento de ideias tem de passar, necessariamente, pelo filtro da linguagem, a probabilidade de haver desentendimentos é bastante considerável.

Parece ser razoável afirmar, portanto, que o desentendimento, a divergência e o conflito de idéias são inevitáveis nas nossas relações. Pouco ou quase nada se pode fazer para evitá-los. Entretanto, a atitude agressiva frente a este tipo de situação, esta, sim, pode e deve ser sempre evitada. O problema é que, para isto, a pessoa tem de ser capaz de dominar suas próprias emoções, o que quase nunca é uma coisa fácil de fazer.

Um bom começo para se evitar os rompantes e suas trágicas consequências é uma espécie de condicionamento comportamental, comum na psicologia, que, como o próprio nome diz, condiciona a pessoa a tomar determinadas atitudes antes que a "explosão" ocorra. Outra forma é pelo auto-conhecimento, já que conhecendo seus próprios limites, a pessoa passa a identificar, em si mesma, sinais que antecipam a perda do controle, abrindo a possibilidade de deixar a situação antes dela degringolar.

Mas a vantagem do auto-conhecimento em relação ao condicionamento é que o primeiro, além de produzir resultados perenes, melhora constantemente a compreensão de si mesmo e, consequentemente, da realidade a sua volta. Paralelamente, cresce também a tolerância consigo e com o outro, gerando condições mais propícias ao entendimento e menos às agressões física ou verbal. A desvantagem é que os resultados vêm, geralmente, apenas em longo prazo.

Para os místicos, há também um mantra que ajuda muito quando entoado antes de um potencial desentendimento: "Eu quero estar certo ou ser feliz?".


quarta-feira, 18 de novembro de 2009

A Lenda do Empresário Exemplar.




"Contava a lenda que, em alguma dessas metrópoles contemporâneas, havia um empresário um tanto diferente dos demais... De hábitos comuns, ele, que vivera até então uma vida absolutamente ordinária, acabou por pedir as contas da empresa em que trabalhava para abrir uma lojinha próxima à sua casa. Muitos de seus amigos chegaram até a desconfiar de sua sanidade mental, uma vez que largara um emprego "seguro" para abrir um empreendimento igual a tantos outros naquela redondeza.

Iniciou vendendo exatamente as mesmas bugigangas que seus concorrentes e com o preço um pouco acima do que era praticado por eles. Entretanto, as poucas pessoas que chegavam a entrar ali surpreendiam-se com a simpatia, gentileza e genuína disposição do dono em servi-los bem, independentemente de comprarem algo, ou não. A diferença dos outros lugares era tão grande que as pessoas começaram a voltar só para sentir novamente aquele clima leve e amigável do lugar. Como uma espécie de gratidão, passaram a comprar uma coisa ou outra mais baratinha.

Logo, a lojinha passou a ficar cheia ao longo de todo o dia, praticamente, e os clientes, de tão satisfeitos, não mais se preocupavam em procurar os mesmos produtos mais baratos em outras lojas. Mesmo porque, quando havia qualquer problema em qualquer coisa adquirida lá, o dono da loja fazia questão de trocá-lo e, por vezes, até dava algum desconto em outra compra daquele cliente. Além disso, a lojinha passou a patrocinar alguns programas sociais do bairro, ajudar na coleta seletiva e na plantação de árvores, empregar pessoas da redondeza e até a fazer campanha pela exigência de notas fiscais pelos clientes, apesar de nunca solicitá-las na troca de qualquer produto. Diziam, inclusive, que em raras ocasiões, chegou até mesmo a trocar coisas que sequer comercializava, apenas para agradar pessoas que ele considerava especiais.

Não demorou a abrir outras lojas na cidade, sempre com o mesmo princípio de atender o cliente da melhor forma possível. Vez ou outra, tinha problemas com pessoas desonestas, mas o crescente fluxo de novos clientes, originados pelos cometários de seus satisfeitíssimos fregueses, superava, e muito, os eventuais prejuízos.

E como crescia muito, teve de selecionar e contratar várias pessoas para conduzir seus negócios, sempre as escolhendo pelo caráter e disposição de se desenvolver. Trabalhavam para ele desde gente com excelente formação escolar até quem mal sabia ler e escrever. Todos, entretanto, eram muito educados, humanos, simpáticos, prestativos e repletos de preceitos morais. O empresário também fazia questão de incluir nos benefícios, aquilo que melhor se adequasse às necessidades do funcionário, chegando até a patrocinar a instalação de uma creche, bem próxima a uma de suas lojas só para que uma funcionária, mãe solteira, pudesse trabalhar mais tranquila. Assim, muita gente queria ser empregada por ele...

Percebendo uma oportunidade, investiu quase que a totalidade de seus lucros de seu comércio na construção de uma pequena indústria. A fábrica produziria, exclusivamente, para atender seu comércio mas, concebida nos mesmos moldes, logo cresceu e passou a atender também as lojas de seus concorrentes. A partir daí, seus negócios cresceram exponencialmente.

Quando estava próximo de se tornar o maior pagador de impostos daquele país, o empresário sumiu sem deixar rastros. Após algum tempo, declarado legalmente morto, a fundação que criara para cuidar de seus negócios acabou por vender o controle das operações para grandes organizações concorrentes e se transformou em mais uma ONG comum. Toda aquela filosofia de trabalho acabou absorvida pelos complexos sistemas de gestão corporativa dos controladores foi esvanecendo até sumir por completo. Tudo voltara a ser como antes de surgir aquela pequena lojinha de bairro.

Alguns dizem que o empresário se cansou e foi viver uma vida mais tranquila. Outros acham que ele era um homem santo e, vez por outra, acendem velas e pedem para que ele interceda, de onde estiver, nos costumeiros problemas com produtos e serviços da cidade. Mas o fato, mesmo, é que nunca mais ninguém viu aquele empresário..."

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Partidos Piratas.


Em setembro deste ano, durante as eleições para o parlamento alemão, o Deutsch Piratenpartei (Partido Pirata Alemão) recebeu mais de 800.000 votos, ostentando uma expressiva participação se comparada à conseguida pelos partidos "verdes" em seus primeiros anos de existência. Fundado em 2006, o Piraten Partei defende que as possibilidades proporcionadas pelo desenvolvimento tecnológico sejam direcionadas ao aprimoramento do acesso à informação pela população e não ao controle da vida de cidadãos comuns como vêm sendo feito ultimamente. Além da defesa à privacidade individual, também a livre circulação da cultura e do conhecimento, a reforma do sistema de patentes, a transparência do Estado e a gratuidade da educação pública são outras bandeiras defendidas pelo grupo.

O pioneiro deste ideário político, entretanto, parece ter surgido na Suécia, o Piratpartiet, que já elegeu dois representantes na última eleição para o Parlamento Europeu. Além da Alemanha e Suécia, a Áustria também conta com uma agremiação semelhante, o Piratenpartei Österreichs (Partido Pirata Austríaco), e tudo indica que outros países, principalmente europeus, devem seguir pelo mesmo caminho.

O assunto é polêmico e vem crescendo em relevância com a popularização da internet e a queda dos custos de armazenamento e processamento da informação digitalizada. Paraíso dos libertários e pesadelo dos detentores do poder político e econômico, a rede mundial de computadores praticamente inviabilizou o controle da distribuição de material protegido por direitos autorais e democratizou as fontes de informação.

Pode-se citar como exemplos dessa guerra, o recente recrutamento de aposentados pelo governo chinês para fiscalizar o conteúdo disponibilizado na rede por seu povo ou o emprego ostensivo dos sistemas de monitoramento de mensagens eletrônicas (como o Carnivore, por exemplo) conduzido pelos Estados Unidos da América logo após o ataque às Torres Gêmeas. No ramo musical, grandes gravadoras vêm aumentando expressivamente suas despesas jurídicas, buscando evitar que "suas" músicas sejam compartilhadas entre usuários ao redor do mundo.

Sem julgar o mérito dos pontos defendidos pelos "piratas", pode-se dizer que os atuais sistemas controle de informação, patentes e direitos autorais caminham a passos largos para o fracasso. Isto porque, o atual modelo busca assegurar apenas os interesses econômicos de determinados grupos em detrimento dos demais integrantes da sociedade, incluindo autores, usuários e consumidores.

Quem não se lembra, no final de 2001, da polêmica em torno da decisão brasileira a respeito da quebra de patentes dos medicamentos de utilidade pública? Na época, o então Ministro da Saúde, José Serra, com base em uma lei de sua própria autoria, iniciou as determinações de licenciamento compulsório pelo Nefilnavir, medicamento da Roche usado no tratamento de pacientes soropositivos. Com relação às autorias, até hoje também são comuns as frustrações como a do humorista Chico Anysio (Revista Istoé, edição 2071 de 22/07/2009) que recebeu apenas R$ 249,00 pelos direitos autorais gerados na venda de 15.000 DVDs duplos contendo os melhores momentos de seus programas. Na área tecnológica, quem já tentou registrar uma patente deve ter percebido que, para pessoas comuns, os custos envolvidos são praticamente proibitivos. Por fim, o controle das autoridades burlados pelos compartilhamento peer-to-peer (par-a-par) e pelas diferenças entre as legislações dos locais onde servidores públicos são disponibilizados constantemente.

Assim, mesmo que apenas o futuro seja capaz de dizer, realmente, se os pontos defendidos pelo Piratenpartei serão, ou não, considerados legítimos, atualmente é, com perdão do trocadilho, patente e imediata a necessidade de uma profunda discussão sobre o tema, envolvendo toda a sociedade.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Non ducor duco


O pessoal da prefeitura esteve na rua da minha casa e cortou outra das já pouquíssimas árvores que ainda restam por aqui. Pode parecer estranho, mas em mais de trinta anos, não me recordo de ninguém da prefeitura plantando na rua uma rosa que fosse...

E deu trabalho para levar a árvore! Passaram boa parte da manhã com uma motosserra, cortando o tronco que parecia não querer ser posto aos pedaços no caminhão. A rua ficou mais triste e o cheiro da fumaça prenunciava as dezenas de quilogramas de carbono que a árvore, morta, devolveria ao ar posteriormente. Mas, como me disse um vizinho em outra ocasião, um trabalho a menos, já que não haverá mais folhas caídas pelo chão.

A capital paulista é assim mesmo: dura como o concreto de seu progresso! Nas obras do governo estadual ao longo da marginal do rio Tietê, por exemplo, dezenas (talvez centenas!) de árvores também foram cortadas, sendo, segundo o governador, compensadas pelo plantio de "muitas" outras em alguma reserva próxima. Isto tudo para melhorar a fluidez do tráfego de veículos automotores em São Paulo que, de fato, é insuportável.

É irônico constatar, entretanto, que as zonas mais valorizadas da cidade são as mais arborizadas e/ou próximas a parques com muita área verde. Não apenas isto, a natureza é, frequentemente, o apelo de "marketing" dos vários lançamentos imobiliários que não param de surgir: "ampla área verde privativa", "acesso exclusivo dos moradores ao parque anexo", etc. Qualquer vendedor sabe que a presença de vegetação e água valoriza qualquer imóvel por melhorar sensivelmente a qualidade de vida.

Não por acaso, vários países vêm investindo pesadamente na "reconstrução" de suas áreas verdes, como a Coréia que acabou com as vias marginais ao longo do rio Han, transformando-o em uma jóia ecológica. Diferentemente da rica cidade de São Paulo — cujo PIB responde por quase 20% do nacional — que privilegia a "privatização" das áreas verdes, a impermeabilização do solo e a severidade do microclima.

Se, hoje, um apartamento com vista para o poluído Rio Pinheiros pode ser vendido por alguns milhões de reais (não, você não leu errado!), imagine a que valor o mesmo imóvel poderia chegar se o rio fosse vivo, navegável e com rica mata ciliar... Se as avenidas do entorno ostentassem muitas árvores e se houvesse mais praças e parques repletos de áreas verdes na região... Se a cidade exibisse alternativas de locomoção mais inteligentes e atrativas do que a tortura no trânsito paulistano... Se os turistas não mais sentissem cheiro de esgoto ao adentrar a zona metropolitana...

Mas se não for possível conduzir São Paulo à sustentabilidade, que pelo menos a cidade não conduza* nenhuma outra pelo mesmo caminho...



* "Non ducor duco" é o lema inscrito no brasão da cidade de São Paulo e significa: "Não sou conduzido, conduzo".

domingo, 15 de novembro de 2009

A Ignorância Sobre a Arrogância.


A "arrogância", assim como sua prima "ignorância", é uma palavra difícil de se utilizar. Isto se deve, provavelmente, por seu sentido estigmatizado ao longo dos anos.

Tome como exemplo a palavra "boceta", substantivo feminino que, segundo o Houaiss, significa "caixinha redonda, oval ou oblonga, feita de materiais diversos e [usada] para guardar pequenos objetos". Segundo o mesmo dicionário, outro significado, regionalismo brasileiro do século XIX, seria o de uma "caixa de rapé". Ou uma "bolsa de borracha para guardar fumo", como terceiro significado. Mesmo assim, principalmente se você for brasileiro ou brasileira, dificilmente pensou em algum desses sentidos em primeiro lugar.

Com a "arrogância" e a "ignorância" acontece exatamente a mesma coisa. Ignorar, por exemplo, significa desconhecer, simplesmente. Logo, poderia apostar que você, assim como eu, é ignorante! Talvez em matéria de aramaico, de ídiche, de amorfização metálica... Sei lá! Mas certamente não sabemos a respeito de tudo. Então, o que acaba dando o significado, bom ou mau, da palavra é, exclusivamente, a compreensão que cada um tem sobre a mesma.

Uma pessoa arrogante, por exemplo, é simplesmente aquela que arroga (atribui) a si própria uma posição privilegiada em relação às demais. Isto não faz dela, necessariamente, insolente, mal-educada ou atrevida... Em maior ou menor grau, todos somos arrogantes e, por se tratar de uma característica absolutamente humana, isto não é um problema. O problema surge quando não conseguimos enxergar esta característica em nós mesmos.

Sempre que acreditamos estarmos certos e a outra pessoa errada, estamos sendo arrogantes. Uma pessoa sem arrogância seria, digamos, indiferente a esse tipo de julgamento. A diferença entre meramente apresentar seu próprio ponto de vista e tentar fazer com que o outro pense da mesma forma é muito sutil, mas resulta em atitudes completamente diferentes.

Uma história divertida — talvez fictícia, mas que serve para ilustrar o problema da arrogância — fala sobre uma carta que a assistência técnica de uma montadora teria recebido de um cliente, descrevendo uma falha na partida do carro novo toda vez que ele resolvia tomar sorvete de morango — e só de morango! — em um determinado local. Quando a equipe técnica, humildemente, resolveu investigar o que estava acontecendo, percebeu que a falha ocorria ao tentar religar o veículo dentro de um intervalo de tempo específico, exatamente o que era necessário para ir até a loja que vendia o sorvete de morango. Quando o cliente resolvia comprar outros sabores de sorvete em outras lojas, demorava mais ou menos que o intervalo necessário para o defeito se manifestar.

Se, ao contrário, a equipe tivesse se mostrado arrogante, jamais teria perdido tempo para investigar o problema e desperdiçaria oportunidade para corrigí-lo. A mesma coisa ocorre com idéias e conceitos que discutimos com outras pessoas. Sem uma pré-disposição de se colocar no lugar do outro, considerando a possibilidade dos próprios conceitos estarem equivocados, não há como entender o que está sendo dito e se perde valiosas oportunidades de evolução.

Durante a "tsunami" que varreu a costa de vários países no Oceano Índico em 2005, uma tribo local se salvou por causa de uma lenda antiga que alertava sobre o mau presságio do excessivo recuo do mar e que, quando percebessem isto, todos deveriam se refugiar nas regiões altas mais próximas. Se você estivesse lá e um nativo amigo seu tivesse invadido seu quarto lhe alertando sobre o prenúncio do mal, você teria rido de sua crença ou considerado a situação?

sábado, 14 de novembro de 2009

Sexta-feira 13!


Você acreditaria se lhe dissessem que o Rodoanel caiu? Não?! Pois é... Caiu! Segundo o portal de notícias R7, três vigas de sustentação do viaduto sobre a Rodovia Régis Bittencourt, altura do km 277, na região de Embu das Artes na Grande São Paulo, despencou sobre um caminhão e dois automóveis por volta das 21:10 h de ontem, deixando três pessoas feridas. Este é o segundo acidente relevante em obras públicas capitaneadas pelo governo paulista. O outro ocorreu em meio a construção da Linha 4 do Metrô, na zona oeste paulistana, em janeiro de 2007.

Segundo pessoas que passavam por lá, parece que, no momento do acidente, não havia na região sinais de temporal ou de um eventual abalo sísmico. Aguardemos, então, as especulações sobre as causas que serão, brevemente, veiculadas pela imprensa.

Independentemente dos culpados e das causas, que deverão ser apuradas por pessoal qualificado e em tempo hábil, parece que o Rodoanel, de fato, carrega alguma maldição... Talvez rogada por seu próprio defensor, Mário Covas, que faleceu convicto de que não deveria haver cobrança para sua utilização. Seus sucessores, do mesmo ideário político, não só fizeram justamente o contrário, como também desrespeitaram a Lei Estadual nº 2.481/53 ao autorizarem a construção das praças de pedágio a menos de 35 km do marco zero da cidade. Vai ver é por isso que a obra, além de emperrar em todas as áreas — financeira, ambiental, política, etc. —, mantendo-se eternamente atrasada, ainda sofre um revés inexplicável como este desabamento.

Ou talvez não seja nada disso e o governo paulista esteja apenas com azar. Afinal, ontem foi sexta-feira treze e os duendes do mal estavam todos à solta por aí!


sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Complicações Lucrativas.


Prepare-se! Você e dezenas de outros milhões de brasileiros terão de trocar os conectores e tomadas residenciais segundo o novo padrão aprovado pela resolução do Conselho Nacional de Metrologia (Conmetro). O novo padrão, de três pinos redondos e encaixe profundo, foi concebido, segundo a Associação Brasileira de Normas Técnicas, para aumentar a segurança dos usuários, diminuindo o risco de choques elétricos.

A partir de 2010, os eletrodomésticos que necessitem de um contato para aterramento já começam a sair de fábrica com os conectores de três pinos, restando para o brasileiro duas opções: comprar um adaptador ou comprar uma nova tomada. Detalhe: o conector não é compatível com nenhum outro do planeta! Bom para a indústria nacional de componentes elétricos, ruim para a indústria de eletroeletrônicos e péssimo para o consumidor, a mudança promete complicar bastante a vida de qualquer cidadão que se utilize de energia elétrica.

Em tempos de simplificações e unificações de unidades, moedas, normas, padrões, ortografia, etc., os órgãos que deveriam simplificar, complicam! Senão, vejamos:

1. Qualquer produto importado necessitará de adaptação.
2. Qualquer produto exportado necessitará de adaptação.
3. Durante anos, produtos nacionais também necessitarão de adaptação.

O custo de tudo isto para a economia, o aumento na geração de resíduos, a perda de tempo e dinheiro nas substituições, etc., ou não foram consideradas ou foram suprimidas por interesses exclusivos de algum grupo econômico-financeiro. Aparentemente, pelo menos, a mudança é absolutamente indigesta e a motivação não parece ter considerado apenas o bem-estar do consumidor ou os interesses do país.

Mas, parodiando um dito popular, se é possível complicar, para que facilitar, não é mesmo?!

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

E por falar em energia...


Qualquer engenheiro, cientista ou pesquisador sabe que o avanço em uma determinada área da ciência está intimamente relacionado ao volume de investimento destinado à pesquisa dessa área. Um exemplo típico e genuinamente brasileiro foi o da viabilização do etanol como combustível alternativo à gasolina durante a crise do petróleo na década de 1970. Idealizado pelo físico José Walter Bautista Vidal e financiado pelo governo brasileiro, o Programa Nacional do Álcool (Pró-álcool) transformou o Brasil no primeiro país do planeta a utilizar um combustível renovável em larga escala. — Só a título de curiosidade, um dos principais responsáveis pelo desenvolvimento da proteção anti-corrosiva dos antigos carburadores dos carros a álcool, Prof. Dr. Stephan Wolynec, permanece como professor titular do Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.

Atualmente, entretanto, o grupo que detém a chave do cofre, ou seja, os membros do Poder Executivo, é justamente quem parece não saber dessa estreita relação entre investimento e avanço científico. Enquanto o mundo¹ ² luta para se livrar das usinas nucleares, tanto a Ministra da Casa Civil, Dilma Roussef, quanto o Ministro de Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, planejam gastar algumas dezenas de bilhões do orçamento na construção de novas usinas nucleares. Só a conclusão de Angra III custará aos cofres públicos cerca de R$ 7,5 bilhões! Se uma fração disto fosse investido na prospecção de energias limpas e renováveis, como a solar e a eólica, os ganhos não se limitariam apenas a um novo pioneirismo brasileiro na área energética, mas também na melhoria da debilitada produção científica nacional. Entretanto, segundo a ministra Dilma, é uma piada pensar, hoje em dia, na energia solar e/ou eólica como fontes alternativas para uma reconfiguração da matriz energética brasileira.

O Brasil é o maior país em extensão territorial na região do equador, o que nos leva a pensar que se a energia solar não for viável aqui, não o será em nenhum outro lugar do mundo. Além disso, a região nordeste, principalmente o Ceará, conta com ventos contínuos em uma quantidade pelo menos duas vezes superior à que foi necessária para viabilizar economicamente a obtenção de energia eólica na Alemanha, por exemplo. Segundo o Greenpeace, há um potencial de praticamente duas "Itaipus" no litoral cearense. Sem falar no que campanhas estatais bem dirigidas poderiam ganhar em termos de otimização energética³ em regiões densamente povoadas como as grandes capitais.

Mesmo assim, continuamos fazendo "piadas" com antigas fórmulas aplicadas a problemas novos...


quarta-feira, 11 de novembro de 2009

O Apagão da Noção.


Quem possui uma vaga noção do que seja uma análise de falha sofre com o que é discutido nos jornais a cada incidente noticiado. Discute-se, pública e irresponsavelmente, as causas e os culpados de eventos que, frequentemente, sequer foram adequadamente entendidos.

Alguém se lembra do desastre com o vôo 3054 em Congonhas, São Paulo? À época, era comum se alardear na imprensa a causa do acidente como sendo a falta de "grooving" (ranhuras) na pista e, como culpado, o Governo Federal por não tê-lo providenciado antes de liberar a pista para uso. Mais de dois anos depois, o resultado da investigação do Cenipa, no entanto, acusou como prováveis causas falhas mecânica ou humana...

No blecaute de ontem, ouviu-se a mesma ladainha: a causa foi a falta de investimento no setor energético e o culpado, claro, o Governo Federal. O Jornal da Globo de hoje (11/11/09), por exemplo, usou absolutamente todo o seu espaço para noticiar unicamente o "apagão" e suas consequências na vida de milhões de brasileiros, sempre apontando o Poder Executivo como o culpado pelo episódio. Quem não tivesse assistido ou lido qualquer outro veículo, certamente acharia que nada mais de importante acontecera no Brasil ou no mundo...

Ora, é bastante óbvio que ocorreu uma falha no sistema de distribuição energética, ou mais da metade do Brasil não teria ficado às escuras. Mas daí a dizer que foi por falta de geração de energia, investimento insuficiente, segurança deficiente, gestão equivocada ou qualquer outra coisa que o valha é a mais pura e irresponsável especulação. Sob pressão, até o Ministério de Minas e Energia entrou na onda, apresentando uma resposta meramente especulativa, já que ninguém explicou como as "condições atmosféricas adversas" poderiam causar o problema.

Os técnicos do Cenipa, no caso do acidente aéreo, não demoraram mais de dois anos para finalizar o relatório porque são incompetentes, mas porque têm responsabilidade com a informação a ser divulgada, coisa que parte da imprensa e dos políticos parece não saber bem o que significa. O desserviço que este tipo de informação vazia causa na sociedade é incalculável, tanto quanto o fato disto ser, muito provavelmente, proposital.

Parece que a baixaria eleitoral já começou, bem antes do tempo regulamentar...

terça-feira, 10 de novembro de 2009

80 Homens Para Mudar o Mundo!


Sylvain Darnil e Mathieu Le Roux são dois franceses que, expatriados para o Brasil e trabalhando por empresas francesas em São Paulo, acabaram por se conhecer em uma das muitas churrascarias paulistanas, durante um jantar promovido por um amigo em comum. Alguns meses mais tarde, decidiram empreender uma viagem ao redor do mundo, conhecendo pessoalmente as personalidades que vêm transformando o mundo com suas ações, focadas no desenvolvimento sustentável.

O resultado foi um livro: "80 Homens Para Mudar o Mundo" (tradução: Rita Myrian Zagordo — São Paulo: Clio Editora, 2009. 240 p.), um misto de aventura, documentário e biografias. As histórias e os projetos de pessoas como Muhammad Yunus, Carlo Petrini, Govindappa Venkataswamy, William Drayton, Fábio Rosa, Hernando de Soto e Rodrigo Baggio, só para citar alguns, são verdadeiros tapas na cara dos inúmeros "profetas do apocalipse" que encontramos por aí todos os dias! São 80 nomes que desafiaram todas as adversidades e preconceitos, fazendo com que suas iniciativas, nas mais diversas áreas da atividade humana, transformassem a vida de milhões de pessoas, além de nosso próprio mundo como um todo.

Surpreenda-se com Muhammad Yunus e a rentabilidade de sua idealização, o Grameen Bank de Bangladesh, permitindo que três quartos de seus clientes saíssem da extrema pobreza. Encante-se com a luta do indiano Govindappa Venkataswamy e de seu parceiro norte-americano David Green na luta contra a catarata, mantendo um hospital que atende gratuitamente dois a cada três pacientes e, mesmo assim, mantém-se lucrativo. Ou admire-se com a criatividade do arquiteto William McDonough em conceber um edifício que produz mais energia do que consome e não gera resíduos! Depois de tudo, provavelmente terá a sensação de ter lido uma obra de ficção, mesmo sendo tudo a mais absoluta realidade.

Para quem tiver curiosidade sobre o projeto de Sylvain e Mathieu, o sítio www.80hommes.com possui vasta informação, inclusive com os perfis e fotos das personalidades apresentadas no livro.

E talvez depois de conhecer essas histórias, assim como eu, você também concorde com a frase de John F. Kennedy, exibida logo na capa do livro: "Os problemas do mundo não podem ser resolvidos por céticos ou cínicos, cujos horizontes se limitam às realidades evidentes. Temos necessidade de homens capazes de imaginar o que nunca existiu.".

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Santa Catarina: se quéis, quéis! Se não quéis, diz...


Santa Catarina é, na minha opinião, um dos estados mais bonitos do Brasil. Gente bonita e agradável, clima ameno, abundantes áreas verdes no interior e um litoral maravilhoso acabaram por dar ao estado sua vocação turística, atraindo gente de toda a parte. Experimente, por exemplo, o aconchego de Blumenau no inverno ou o agito das praias de Balneário de Camboriú no verão. Além disso, há inúmeras outras atrações menos conhecidas como os cânions e reservas ecológicas na região da cidade de Praia Grande, o "Rafting" em Apiúna e o cenário surreal da Guarda do Embaú.

Mas, pessoalmente, diria que é a capital do estado que guarda a magia do lugar... Formada por uma parte insular e outra continental, Florianópolis é singular. Sua ilha, com mais de cem quilômetros de extensão, praias maravilhosas e riquezas culturais, é um convite para todos os gostos.

Para os "baladeiros de plantão", a Praia Mole é a pedida do dia e o Centrinho da Lagoa, a da noite. Já os mais sossegados talvez prefiram a extensão da Praia de Moçambique. Para os "naturebas", nada melhor do que fazer a trilha até a Praia da Lagoinha do Leste. Os "Gourmets" podem se deliciar com uma variedade de restaurantes, dos mais requintados, em Jurerê Internacional, até os de especialidades locais, em Pântano do Sul. Para os "historiadores", vale uma passadinha no Costão do Santinho. E se você, como eu, for assim... eclético, vai até se atrapalhar com a variedade de opções. Caso esteja disposto a rodar, comece o dia na Praia Brava, saboreie ostras e cerveja à beira mar no Ribeirão da Ilha, jante no finalzinho da tarde no mirante do Ponto de Vista e agite a noite em algum lugar próximo à Lagoa da Conceição: é muito provável que não se arrependa!

Há também a Ponte Hercílio Luz, o Mercado Municipal, Dona Bilica e Seu Maneco, a arquitetura de Santo Antônio de Lisboa, o folclore açoriano, o Museu Cruz e Souza, a figueira centenária, a igreja da Ordem Terceira de São Francisco da Penitência, além da praia de Itaguaçu e as lendárias bruxas transformadas em pedras pelo próprio diabo...

E, para quem não sabe, Florianópolis foi fundada por bandeirantes paulistas no final do século XVII com o nome de Nossa Senhora do Desterro. Talvez por isto a gente goste tanto de lá até hoje...



domingo, 8 de novembro de 2009

O Plágio e a Inocência.


Em 2007, a Universidade de São Paulo, uma das mais conceituadas do Brasil, e talvez de todo hemisfério sul, foi palco de um vexatório caso de plágio. Em maio deste ano, um engenheiro formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte plagiou dois artigos, praticamente inteiros, de grupos de pesquisadores da Universidade Federal Fluminense e da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. E, finalmente, para não parecer que este seja um problema exclusivamente brasileiro, outro caso de plágio, desta vez envolvendo cientistas da Universidade de Newcastle no Reino Unido, foi noticiado, recentemente, em agosto último.

Sem qualquer pretensão de julgar ou justificar as intenções dos plagiadores, é bom que se diga: não há uma disciplina sobre metodologia científica na grade curricular da educação brasileira. Pior, são raras são as graduações e pós-graduações que chegam a oferecer essa matéria. Além disto, com o crescente volume de informação disponível, principalmente na internet, fica cada vez mais fácil apropriar-se de idéias alheias como se fossem próprias. Se você é professor ou professora, já deve ter identificado vários trabalhos do tipo "copy-and-past" ("copiar-e-colar") da internet, entregues sem a menor vergonha...

Não bastasse tudo isso, uma rápida busca pela rede mundial já é suficiente para se encontrar desde diplomas prontos até profissionais que, bem pagos, encarregam-se da pesquisa, redação, referenciação e diagramação para qualquer estudante mais ocupado. Parece que o "ter" tem conseguido se manter como mais importante do que o "ser" na sociedade moderna.

A parte cômica, para não ficar apenas na trágica, é que a também inocência parece aumentar na mesma proporção: como a fonte da informação "não é relevante", qualquer coisa que qualquer pessoa diga ou escreva passa a ser digno de atenção. Basta notar a quantidade de lendas urbanas e casos "sem-pé-nem-cabeça" que inundam nossas caixas de mensagens eletrônicas e, muitas vezes, até servindo como argumentos para os mais diversos pontos de vista. E quantos julgamentos não são feitos apenas com o que se ouve dizer?

O tomar para si as idéias de outrem encerra uma armadilha meticulosamente preparada por gente mais inteligente. Acaba que o espertalhão, cedo ou tarde, vira motivo de piada entre seus pares pensantes.

Parece que mesmo depois da famosa transmissão de Orson Welles, há 71 anos atrás, há quem, ainda hoje, aceite qualquer informação sem ao menos refletir sobre ela...


sábado, 7 de novembro de 2009

Hipocrisia Sem-vergonha!


No dia 22 de outubro, uma estudante foi assistir às aulas trajando um vestido rosa-choque curto. O que se seguiu foi um verdadeiro "show" de hipocrisia, intolerância e violência. A vítima, uma garota de 20 anos, teve de ser escoltada para fora da universidade debaixo de vaias, xingamentos e humilhações por parte dos alunos e outros que acabaram "entrando na onda".

Não bastasse o absurdo do acontecimento, a universidade, em uma sindicância interna, resolve expulsar a aluna por infringir o regulamento ao trajar roupa inapropriada! Mais tarde, com a repercussão do caso, acabaram por voltar atrás, suspendendo punições e adotando medidas "educativas" a todos os envolvidos.

A situação é um total contra-senso e, como tal, muito interessante. Programas televisivos, expondo pessoas com pouquíssima, ou nenhuma, roupa em situações que fariam corar até alguns "hippies" de Woodstock, fazem extremo sucesso entre os jovens brasileiros. "Inferninhos", casas de prostituição e orgias se multiplicam nas grandes cidades. Quem não se lembra das imagens captadas por uma câmera escondida em um "cafofo" em uma festa de outra universidade paulistana?

Mesmo assim, em pleno século XXI, uma garota é publicamente execrada por jovens alunos de uma universidade. Pior... Muitos ainda tentaram justificar a atitude pré-histórica com o comportamento supostamente insinuante da garota!

Bom, tamanho interesse pelo comportamento alheio explica, pelo menos, o porquê dos "reality-shows" e das novelas fazerem tanto sucesso...



sexta-feira, 6 de novembro de 2009

"Pergunta idiota, tolerância zero!"

Quem não se lembra do quadro "Saraiva", interpretado pelo saudoso Francisco Milani no programa Zorra Total da Rede Globo? Bom, se não se lembra, não poderia lhe culpar, já que o quadro era um dos poucos realmente engraçados em todo o programa...

O "Saraiva" — e o Milani encarnava perfeitamente a personagem — era um cara absolutamente "estressado" com perguntas óbvias ou imbecis, muito comuns em nosso cotidiano, mas que acabamos não dando atenção e respondendo quase que automaticamente. Lembro-me de uma das passagens, quando Saraiva e sua inseparável "Carolininha" — que sempre tentava mantê-lo calmo — vão a uma banca na feira livre:

— Por favor, o senhor pode me ver uma dúzia de bananas?
— O senhor vai levar?
— Não... Não! É pra agora mesmo! Vou comer uma dúzia de bananas bem aqui na sua frente e cair duro de congestão!

O texto era mais ou menos assim, mas já dá para se ter uma ideia do humor da personagem. Mas por que me lembrei disso? Porque a grande maioria dos atendimentos de "telemarketing" desafiam a paciência de qualquer cristão que tente resolver um problema, por mais simples que seja. Não importa a empresa ou o setor, estatal ou privado, nem o meio de contato — telefônico, eletrônico ou presencial — você não vai conseguir fazer com que seu problema seja entendido de pronto. E, se por um acaso conseguir, não o terá resolvido facilmente.

Qual seria a necessidade de se existir alguém para dizer, simplesmente, que "o sistema funciona dessa forma"? Ou, para que serve uma ouvidoria que nada pode fazer além de "alimentar relatórios para  as instâncias superiores"?

Noutro dia, já sem paciência com o atendimento de uma das "teles", recorri à agência reguladora, já que, de fato, um dos problemas, além da já costumeira má vontade da empresa, era na regulação do setor. Quem disse que alguém entendeu o problema? Já sem paciência de novo, dessa vez com a agência, formulei um questionário com três perguntas do tipo "sim-ou-não" e solicitei à ouvidoria que, simplesmente, respondesse-me por escrito. Há mais de um ano estou aguardando a resposta...

Em tempos de redução de custos, por que não acabar com todo esse aparato já que para nada serve? Aí, quem sabe algum "Saraiva" de alguma diretoria perca a paciência de vez e queria solucionar o problema de fato?

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Sem respeito, não há direito!


Hoje ocorreu uma paralização dos ônibus urbanos na zona norte da cidade de São Paulo. Motoristas e cobradores da Viação Sambaíba fizeram uma manifestação e deixaram de atender cerca de 620 mil usuários do transporte público, voltando a trabalhar por volta do meio-dia.

Trabalhadores, aposentados e estudantes, entre outras pessoas, perderam seus compromissos na manhã de hoje. Consultas médicas agendadas há muito tempo, aulas, reuniões, compromissos sociais e uma infinidade de outros eventos importantes foram perdidos, talvez para sempre. As dezenas, talvez centenas, de funcionários da Viação Sambaíba, para defender seus direitos, prejudicaram, deliberadamente, a vida de centenas de milhares de cidadãos. E o Sindicato dos Motoristas e Trabalhadores de Transporte Rodoviário Urbano de São Paulo sequer pensou em avisar a população com uma antecedência mínima para, ao menos, diminuir o transtorno para as pessoas comuns.

O mais triste de tudo isto é que não se trata de um problema isolado. É cada vez mais comum o desrespeito com o semelhante em todas as esferas sociais. Furta-se de outro porque teve algo furtado primeiro. Prejudica-se o outro porque foi, antes, prejudicado. E todos querem ser respeitados, sem nunca respeitar o outro! Começo a suspeitar que não seja apenas mera falta de inteligência...

O mundo é, bem da verdade, como um espelho. O que se vê nele é, em princípio, um reflexo de si mesmo. Além disso, como todo espelho, se iluminado muito fortemente, certamente ofuscará a vista de quem nele se observa. Queira Deus que ninguém fique cego...


quarta-feira, 4 de novembro de 2009

"Burrocracia"


Quem visita Praga, uma das cidades mais lindas da Europa, pode se espantar ao dar de cara com o Café Franz Kafka, meio escondido entre os becos e ruas estreitas da capital tcheca. Um dos maiores nomes da literatura ocidental do século XX, Franz Kafka (1883-1924), foi um dos mais importantes escritores de ficção em língua alemã, apesar de ser tcheco. Nascido no seio de uma família judia de classe média, Kafka, apesar de praticamente fluente em tcheco, teve o alemão como sua primeira língua, com a qual produziu suas obras literárias. De modo geral, seu trabalho é marcado por conflitos existenciais, culpa, perseguição, etc., ao ponto dos estudiosos chegarem a definir um mundo kafkaniano.

Quem nunca leu nenhum de seus livros, prepare-se! Bastante minucioso, Kafka apresenta seu mundo de forma impessoal e pode levar os mais ansiosos à loucura! Uma de suas principais obras, O Processo (1925), conta a história de um certo Joseph K., um pacato cidadão que é preso, julgado e condenado sem sequer saber por que. O leitor é levado a se desesperar, tanto quanto o protagonista, com a burocracia e a impessoalidade do sistema estatal. Qualquer semelhança é mera coincidência...

À despeito do tom sério e monotônico do texto, há passagens divertidíssimas, como logo no início, quando K. acorda e é surpreendido por dois agentes:

(...) — Não pode sair, está preso!
— É o que parece — revidou K. — Mas por que? — acrescentou em seguida.
— Não estamos autorizados a dizer-lhe. Vá para seu quarto e espere lá. Abriu-se um inquérito contra o senhor, que será informado de tudo no devido tempo. Estou infringindo as ordens que me foram dadas, falando-lhe assim gentilmente. Espero, porém, que ninguém esteja ouvindo a não ser Franz, que por sua vez também se permitiu demasiadas cordialidades ao dirigir-se ao senhor. Se continuar a ter tanta sorte como a que teve com os dois guardas escolhidos para vigiá-lo, pode sentir-se confiante quanto ao resultado final.
(...)


E se você acha que a burocracia brasileira é terrível, leia o livro. E você vai descobrir que a gente não inventou nada!



terça-feira, 3 de novembro de 2009

A Imprensa e o Leprechaun da Imparcialidade


No dia 14 de agosto deste ano, a notícia na Folha de São Paulo sobre a suposta agressão de "chavistas" a opositores da nova Lei Orgânica de Educação da Venezuela, chamava a atenção pela costumeira "simpatia" ao governo venezuelano já no título da matéria: "Na Venezuela, chavistas atacam opositores de nova lei de educação". Logo abaixo, complementava-se o título: "Doze jornalistas ficaram feridos; Congresso votaria projeto na noite de ontem".

O texto é uma pérola da imparcialidade! Adjetivos como "controvertida [nova Lei Orgânica de Educação]" e "supostos [militantes]" (alguém notou qualquer dúvida sobre a identidade dos agressores no título?) ilustram o tom da reportagem. Mas, segundo o mesmo jornal, o 50º artigo, causador da polêmica, diz apenas que "Os que dirigem os meios de comunicação estão obrigados a dar sua colaboração na tarefa educativa e ajustar sua programação para o sucesso dos fins e objetivos consagrados na Constituição e na lei", sendo que isto limitaria o sagrado direito à liberdade de expressão.

Ora, partamos do princípio: a imprensa é uma atividade exercida exclusivamente sob a concessão do Estado. Isto porque o serviço, além de extremamente importante, exerce uma influência significativa na opinião pública e, consequentemente, nos destinos da Nação. Por que razão deveria ser optativo à imprensa o cumprimento, ou não, de seu papel social?

Há que se acabar, de uma vez por todas, com a hipocrisia e leviandade em torno da liberdade de expressão. Atualmente, parece que qualquer tentativa de se responsabilizar instituições, editores e repórteres pelo que publicam é tida como cerceamento de liberdade. Entretanto, não é tão assombrosamente mais irracional permitir que um órgão de comunicação de massa publique o que bem entender, sem qualquer responsabilidade pelo seu conteúdo? Se não há problemas nisto, por que haveria problema na veiculação de quaisquer anúncios publicitários, seja de cigarros, bebidas ou medicamentos? Por que um setor pode ser tão regulado e outro nada? Este tipo de discurso, que mistura responsabilização com censura, vem exatamente daqueles que usam e abusam da imprensa como ferramenta para atingir seus objetivos de poder em detrimento de toda a sociedade.

E se você é daqueles que ainda acredita na imparcialidade da imprensa, siga o arco-íris! Lá no final, o Leprechaun da imparcialidade lhe aguarda com seu pote de ouro!

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Temporalidades Cósmicas


A TV Cultura está apresentando uma série chamada "Invenção do Contemporâneo" que vai ao ar às 23:59 h de segunda-feira, sendo reprisado às 3:40 h das quartas. São palestras patrocinadas pela CPFL Energia versando sobre os mais diversos temas da contemporaneidade humana. Hoje, o palestrante foi o pesquisador Dr. Darcy Pedro Svisero que falava sobre as "Temporalidades Cósmicas", apresentando teorias e evidências a respeito da dinâmica geológica terrestre e contextualizando os seres vivos, não como agentes, mas como meros participantes nessas mudanças. A palestra pode ser vista integralmente na página da cpflcultura.

Como comentado aqui em outro texto (23/09/09: De volta à realidade!), o período de existência da humanidade é irrepresentável na escala de tempo cósmica. O que dizer, então, do tempo de vida de um único ser humano... Mais ou menos nessa linha, Dr. Svisero vai apresentando uma série de registros geológicos que embasam a divisão temporal por nós concebida, até chegar a recentes observações astronômicas e os atuais limites para o conhecimento humano. Entre esses limites, estão os tempos necessários para eventuais visitas a alguns astros. No caso da Lua, por exemplo, foram necessários cerca de dois dias para se chegar lá. Para outros planetas, voando a cerca de 40.000 km/h (velocidade aproximada de uma sonda espacial), seriam necessários nove meses para se chegar a Marte e por volta de dois anos para se alcançar Júpiter. Já para a galáxia grande mais próxima, Andrômeda, seriam necessários cerca de 68.000 anos!

Teria Deus nos condenado a contemplar apenas uma fração infinitésima de Seu universo?!



domingo, 1 de novembro de 2009

Cegos? Nós?!


O final de semana prolongado não foi só de sol, mas também de penumbra, tanto na sala de cinema quanto na sala de casa... Assisti, na sexta, dois filmes que estrearam recentemente nas grandes telas: Substitutos com Bruce Willis e Distrito 9 de Peter Jackson. Nada de especial em nenhum dos dois.

No primeiro, um policial investiga uma arma capaz de matar pessoas conectadas à realidade virtual — ao estilo "Second Life", mas utilizando androides controlados remotamente — que a sociedade adotara como uma forma segura para interagir. O destaque vai para os efeitos especiais e a visão, um tanto heterodoxa, de futuro.

Já no segundo, uma nave espacial aporta misteriosamente sobre a cidade de Joanesburgo e, após intervenção humana, os extra-terrestres são trazidos à terra firme e acabam segregados, junto com outros seres humanos, em uma espécie de gueto chamado de Distrito 9. Os conflitos começam quando decidem mudá-los de lugar... O filme vale mais pela crítica social e humana em torno do problema fictício.

Mas o filme que roubou a cena mesmo foi o de hoje, Ensaio Sobre a Cegueira, baseado no romance de José Saramago e dirigido por Fernando Meirelles. O filme é, segundo o próprio autor, representação fiel da obra literária. Além disso, traz excelentes tomadas de câmera, fantásticas composições de imagem, ótimos cenários, trilha musical originalíssima do grupo mineiro Uakti e a atuação marcante de nomes como Julianne Moore e Danny Glover.

A história se passa na atualidade, quando um surto de cegueira toma conta de toda a humanidade, com exceção da protagonista. Logo, os primeiros a apresentarem os sintomas, além da protagonista por opção própria, são encaminhados a uma espécie de sanatório e mantidos em quarentena. Não demora a chegada de outros e mais outros, até o limite da capacidade do local, quando conflitos entre os internos começam a acontecer.

Dentre os vários pontos de vista para se compreender a história, o de que já estamos todos cegos é o mais surpreendente. Vale muito a pena assistir e conferir por que!