domingo, 15 de novembro de 2009

A Ignorância Sobre a Arrogância.


A "arrogância", assim como sua prima "ignorância", é uma palavra difícil de se utilizar. Isto se deve, provavelmente, por seu sentido estigmatizado ao longo dos anos.

Tome como exemplo a palavra "boceta", substantivo feminino que, segundo o Houaiss, significa "caixinha redonda, oval ou oblonga, feita de materiais diversos e [usada] para guardar pequenos objetos". Segundo o mesmo dicionário, outro significado, regionalismo brasileiro do século XIX, seria o de uma "caixa de rapé". Ou uma "bolsa de borracha para guardar fumo", como terceiro significado. Mesmo assim, principalmente se você for brasileiro ou brasileira, dificilmente pensou em algum desses sentidos em primeiro lugar.

Com a "arrogância" e a "ignorância" acontece exatamente a mesma coisa. Ignorar, por exemplo, significa desconhecer, simplesmente. Logo, poderia apostar que você, assim como eu, é ignorante! Talvez em matéria de aramaico, de ídiche, de amorfização metálica... Sei lá! Mas certamente não sabemos a respeito de tudo. Então, o que acaba dando o significado, bom ou mau, da palavra é, exclusivamente, a compreensão que cada um tem sobre a mesma.

Uma pessoa arrogante, por exemplo, é simplesmente aquela que arroga (atribui) a si própria uma posição privilegiada em relação às demais. Isto não faz dela, necessariamente, insolente, mal-educada ou atrevida... Em maior ou menor grau, todos somos arrogantes e, por se tratar de uma característica absolutamente humana, isto não é um problema. O problema surge quando não conseguimos enxergar esta característica em nós mesmos.

Sempre que acreditamos estarmos certos e a outra pessoa errada, estamos sendo arrogantes. Uma pessoa sem arrogância seria, digamos, indiferente a esse tipo de julgamento. A diferença entre meramente apresentar seu próprio ponto de vista e tentar fazer com que o outro pense da mesma forma é muito sutil, mas resulta em atitudes completamente diferentes.

Uma história divertida — talvez fictícia, mas que serve para ilustrar o problema da arrogância — fala sobre uma carta que a assistência técnica de uma montadora teria recebido de um cliente, descrevendo uma falha na partida do carro novo toda vez que ele resolvia tomar sorvete de morango — e só de morango! — em um determinado local. Quando a equipe técnica, humildemente, resolveu investigar o que estava acontecendo, percebeu que a falha ocorria ao tentar religar o veículo dentro de um intervalo de tempo específico, exatamente o que era necessário para ir até a loja que vendia o sorvete de morango. Quando o cliente resolvia comprar outros sabores de sorvete em outras lojas, demorava mais ou menos que o intervalo necessário para o defeito se manifestar.

Se, ao contrário, a equipe tivesse se mostrado arrogante, jamais teria perdido tempo para investigar o problema e desperdiçaria oportunidade para corrigí-lo. A mesma coisa ocorre com idéias e conceitos que discutimos com outras pessoas. Sem uma pré-disposição de se colocar no lugar do outro, considerando a possibilidade dos próprios conceitos estarem equivocados, não há como entender o que está sendo dito e se perde valiosas oportunidades de evolução.

Durante a "tsunami" que varreu a costa de vários países no Oceano Índico em 2005, uma tribo local se salvou por causa de uma lenda antiga que alertava sobre o mau presságio do excessivo recuo do mar e que, quando percebessem isto, todos deveriam se refugiar nas regiões altas mais próximas. Se você estivesse lá e um nativo amigo seu tivesse invadido seu quarto lhe alertando sobre o prenúncio do mal, você teria rido de sua crença ou considerado a situação?

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