quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Atuais Limites da Conceituação Humana


Muita coisa está bem além da nossa capacidade de compreensão. É fato. Se a realidade se resumisse ao que nós conhecemos dela hoje, estaríamos condenados à eterna estagnação da inteligência. Afinal, qual seria o propósito do aprendizado, da evolução e do desenvolvimento se já soubéssemos tudo? E, neste sentido, a ignorância, o não-saber, é uma bênção pois nos permite aprender, evoluir e se desenvolver. Hoje em dia, o volume de conhecimento da humanidade praticamente dobra a cada dois anos, velocidade que vem aumentando exponencialmente. Mesmo assim, sequer experimentamos uma pequena fração de tudo o que existe. Portanto, há muito — mas muito mesmo! — o que se aprender.

Compreendemos o mundo a nossa volta, unicamente, através de nossos sentidos e de nossa racionalidade. E, como cada um de nós é um ser único, parece evidente que cada pessoa possua a sua própria visão, única e exclusiva, do que está ao seu redor. Alguém que nasça cego, por exemplo, terá uma "visão" de mundo bastante diferente de outra pessoa que enxergue ou que já tenha enxergado em algum momento da vida. Similarmente, um indivíduo que tenha nascido com uma mutação genética que lhe permita enxergar mais cores do que é possível às pessoas comuns, também terá uma percepção diferente da realidade.

O que muito pouca gente compreende, entretanto, é que um cego de nascença terá, muito provavelmente, um conceito do que seria a cor vermelha, por exemplo, simplesmente porque foi educado por pessoas que conseguem identificá-la. Ao contrário, o mutante que enxerga uma cor extra, talvez chegue à fase adulta sem enxergá-la, simplesmente porque foi educado por pessoas que não conseguem identificá-la. Portanto, a existência, ou não, da cor e das evidências relacionadas, dependem, exclusivamente, do indivíduo e de mais ninguém.

Foi para minimizar essa relatividade das percepções que se desenvolveu um método, o científico, para permitir um compartilhamento, sistemático, de informações sobre os fenômenos observáveis em cada um desses diferentes "mundos". Segundo este método, um mesmo evento só será considerado causal se, e somente se, puder ser previsto através de um modelo lógico, em geral matemático, possível de ser compartilhado entre vários indivíduos. O fato disto não se aplicar a um determinado evento, entretanto, em absolutamente nada implica na ocorrência do fenômeno em si. É apenas uma maneira de classificar, organizar e compreender o universo de uma forma compartilhada.

Grosso modo, funciona assim: alguém inventa um modelo explicando como algo funciona. Esta "invenção" implica em uma série de consequências que, segundo o método, devem ser observáveis para serem válidas. Se as consequências previstas acontecem de fato, a "invenção", ou teoria, é considerada válida. Caso alguma consequência observada seja diferente daquelas previstas, a teoria está errada — ou é válida apenas em determinadas condições. Necessariamente, outra teoria terá de ser inventada para explicar, também, a exceção.

Um dos campos mais férteis para novas teorias é a Astrofísica, talvez porque o que se observa seja, normalmente, inatingível. Este ramo da ciência usa e abusa da metodologia científica, acima descrita, como ferramenta para o avanço de suas descobertas. Foi assim com a teoria do "Big-Bang", cujo nome, aliás, fora dado pelo astrônomo britânico Fred Hoyle, ironicamente, em uma tentativa de ridicularizá-la.

Em 2005, outro britânico, Simon D. M. White, diretor do Instituto Max Planck de Astrofísica da Alemanha, e sua equipe divulgaram os resultados obtidos em uma monstruosa simulação de computador chamada de "The Millennium Simulation Project" (algo como "Projeto Simulação do Milênio"). O projeto ocupou totalmente o supercomputador do instituto por mais de um mês, simulando, com base nas mais sofisticadas teorias,  a distribuição de matéria em uma região cúbica, com mais de dois bilhões de anos-luz de lado, a partir do monitoramento de mais de dez bilhões de partículas. Foram mais de 25 Terabytes (1 Terabyte = 1024 Gigabytes) em dados de saída, recriando a evolução das mais de 20 milhões de galáxias e dos buracos-negros superdensos que, ocasionalmente, provêm de energia o núcleo dos quasares — abreviação de quasi-stellar radio source: corpos pontuais com forte desvio para o vermelho, maiores que uma estrela e menores que uma galáxia, cujo núcleo, altamente energético, emite ondas de rádio e luz visível. Quem tiver curiosidade, a página do Max-Planck-Institut für Astrophysik exibe uma vasta quantidade de informações a respeito do projeto, incluindo publicações e filmes obtidos com a simulação.

O objetivo do projeto era o de comparar seus resultados com o que é observado, hoje, em nosso universo, buscando coerências ou incoerências nas teorias mais aceitas. A principal dificuldade decorreu da compreensão sobre a energia escura, supostamente responsável pela expansão do universo e que parece se comportar, mais ou menos, como a constante cosmológica presente no equacionamento de Einstein em sua Teoria Geral da Relatividade. Entretanto, se confirmada esta semelhança de comportamentos, ninguém saberia explicar o que isto significa fisicamente. Está, pelo menos por enquanto, um estágio além da conceituação humana.

Mas se você não entendeu patavina, talvez conhecendo a preocupação de White fique mais simples. Segundo ele, os estudos estão muito próximos de um beco sem saída e sem uma ideia realmente inovadora — como a da mecânica quântica no início do século passado — nem maciços investimentos em novos equipamentos serão capazes de resolver o problema.

Assim, esse atual limite da conceituação humana serve para nos mostrar que, apesar de haver coisas muito além de nossa compreensão, isto não as faz inexistentes. E é justamente a crença do ser humano no que ainda há para se descobrir, mesmo sem evidências imediatas, que faz desse limite, quase sempre, temporário. Afinal de contas, o método científico é apenas um método. Não?!


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