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sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Sob tensão


Quando um cupim usa uma secreção para aglomerar e endurecer a terra que molda a habitação de sua colônia, está transformando elementos disponíveis na natureza de forma a atender propósitos específicos de sua espécie. O mesmo ocorre com um pássaro, joão-de-barro, quando mistura fibras vegetais e lama para construir seu ninho. Aliás, a rigor, qualquer síntese orgânica também poderia ser encarada como uma transformação, mesmo que em um nível não intencional, de elementos naturais em materiais úteis à perpetuação da espécie que a sintetiza. Nenhum outro ser, entretanto, chegou próximo da habilidade que os humanos possuem para, intencionalmente, produzir e processar diversos tipos de materiais, desde meras ligas metálicas — obtidas a partir de óxidos minerais — até a produção dos materiais altamente elaborados e tecnológicos que delas se originam. Mas, naturalmente, a gênese de um novo material pode, também, trazer consigo efeitos inéditos de sua interação com o meio ambiente, responsáveis, às vezes, por falhas inusitadas nas estruturas construídas com esses materiais.

Uma dessas falhas é a chamada corrosão-sob-tensão que ocorre subitamente e, em geral, com consequências catastróficas. A corrosão-sob-tensão não é um processo sinérgico e se caracteriza por apresentar múltiplas trincas, face lisa da fratura e praticamente nenhuma perda de material ou danificação da superfície. Ocorre apenas com certas combinações entre ligas metálicas e condições ambientais bastante específicas, envolvendo, necessariamente, tensão de tração (residual ou aplicada) e meio corrosivo bem pouco severo. Um exemplo é o episódio chamado de "season cracking", caso clássico de falha por corrosão-sob-tensão. Conta a história que quase todos os cartuchos de munição, armazenados por tropas inglesas em abrigos improvisados nas selvas indianas, durante o período das monções, foram encontrados totalmente inutilizados (trincados). O caso só foi esclarecido no início da década de 1920, quando cientistas apontaram a umidade condensada com traços de amônia, proveniente da urina dos cavalos, sobre as cápsulas de latão estampado a frio — e portanto, submetido a altas tensões residuais de tração devido ao encruamento — como sendo a causa da falha.

Outros exemplos de combinações suscetíveis à esse tipo de falha são os de aços de baixa resistência submetidos a meios cáusticos (presença de soda cáustica, NaOH), de aços austeníticos na presença de ânions de cloro (Cl¯), além de certas ligas de alumínio de alta resistência, usadas principalmente na indústria aeronáutica, que também falham por corrosão-sob-tensão na presença de umidade — ou seja, água, apenas. Felizmente, uma vez descobertos os modos de falha, é possível evitá-los, contornando suas causas, alterando aplicações ou, simplesmente, abolindo, definitivamente, o uso do material em certas condições críticas. Os responsáveis por essas engenhosas medidas são, em sua grande maioria, os vários engenheiros das mais diversas áreas que, trabalhando colaborativamente, são capazes de transformar em realidade muitos dos sonhos humanos.

Aliás, se aviões fabricados em alumínio de alta resistência continuam voando por aí em dias de chuva é porque os engenheiros, sob tensão para realizar um dos maiores sonhos da humanidade, chegaram à conclusão que pintar a estrutura seria muito mais inteligente e barato do que substituir todo aquele material...

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Fase-S


À primeira vista, o título parece mais o de um texto sobre estratégias para se vencer um jogo de videogame. Longe disso, fase-S se refere a um estado particular assumido pela austenita (fase alotrópica do aço) quando submetida a tratamentos de nitretação (adição de nitrogênio) ou cementação (adição de carbono) ao ponto de ter expandida sua estrutura cristalina original, que é cúbica de face centrada (CFC) — por este motivo, a fase-S também é conhecida como austenita expandida. Associados a esta peculiar configuração cristalográfica, estão muitos defeitos de empilhamento (falhas na sequência de empilhamento dos planos atômicos) e altas tensões residuais, conferindo à fase elevadíssimas durezas (que podem ultrapassar 1500 HV) e resistência ao desgaste por abrasão.

Outra particularidade da fase-S é a elevada concentração de solutos intersticiais (da ordem de 25 at.%) exclusivamente em solução sólida, ou seja, sem a formação de precipitados (fase distinta) devido à interação do carbono, ou do nitrogênio, com os demais elementos da matriz metálica (ferro, cromo, níquel, etc.) que formariam compostos específicos. Tal característica também proporciona uma excelente resistência à corrosão, uma vez que não empobrece a liga metálica dos elementos responsáveis por sua passivação (proteção contra oxidação), tais como o cromo e o níquel. Dessa forma, as aplicações dos aços inoxidáveis austeníticos e ligas de cobalto-cromo e níquel-cromo, importantes em diversos setores — que vão desde a fabricação de componentes críticos para reatores nucleares até apetrechos de cozinha —, podem ser bastante ampliadas, já que suas principais limitações são, justamente, as baixas resistências à abrasão e à corrosão.

As principais técnicas de obtenção da camada superficial de fase-S são os tratamentos termo-químicos de baixa temperatura, especialmente os auxiliados por plasma. Isto porque estes processos possuem a capacidade de eliminar a camada de passivação desses metais durante o processo, eliminando a necessidade de etapas adicionais e permitindo que a difusão dos elementos intersticiais, essencial à formação da camada, não seja prejudicada. Nas últimas duas décadas, a tecnologia de obtenção dessa estrutura vem sendo sensivelmente apurada, não obstante muitas das características fundamentais da fase-S ainda não terem sido satisfatoriamente esclarecidas. Um caminho promissor nesse sentido é o desenvolvimento de novas técnicas para uma avaliação mais efetiva das propriedades mecânicas da camada, tal como a microesclerometria instrumentada, mas isto é um assunto para um outro dia.

Para quem quiser se aprofundar no assunto, uma das melhores referências sobre o tema é o artigo de Dong, H. S-phase surface engineering of Fe-Cr, Co-Cr and Ni-Cr alloys. In: International Materials Reviews. ASM International: 2010. v. 55. n. 2.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

A tribologia


Tente empurrar um carro sem rodas e tenha um vislumbre dos fenômenos estudados pela tribologia, este ramo da ciência e tecnologia que lida com o contato relativo entre superfícies. A etimologia do termo indica que a palavra nasceu da união de dois afixos gregos: "tribo" que significa esfregar, atritar ou friccionar e "logos", significando área de estudo. O campo reúne vários conceitos de matemática, física e química aplicadas, especialmente aqueles relacionados às engenharias mecânica, metalúrgica e de materiais, compreendendo fenômenos ligados à fricção, lubrificação e desgaste. A tribologia busca compreender e modelar os mecanismos relevantes envolvidos na interação estática ou dinâmica entre superfícies, objetivando a previsão e o controle de suas consequências.

Obviamente, o exemplo do carro sem rodas é grosseiro e meramente ilustrativo. Os estudos tribológicos se concentram em um universo nanométrico (1 nanômetro = 1/1.000.000.000 m = 1/1.000.000 mm) onde sutis modificações estruturais no material podem resultar em propriedades físico-químicas absolutamente diferentes. É possível compor estruturas multicamadas com distintos materiais para se obter uma propriedade peculiar — um bom exemplo é a aplicação de uma camada de cromo metálico sobre um aço ligado a fim de promover a adequada adesão de uma camada cerâmica mais superficial, como a de nitreto de cromo (CrN), conferindo à peça uma excelente resistência ao desgaste e alta durabilidade. Por outro lado, pode-se também investigar alterações nos materiais para que se evite a formação de alguma camada entre as superfícies durante a interação — como as que aparecem entre as pastilhas e os discos de freios de alto desempenho, diminuindo o atrito e, consequentemente, prejudicando a frenagem.

Na sociedade moderna, é cada vez mais importante, e comum, o uso racional dos recursos disponíveis. Assim, ao controlar mais precisamente fenômenos como atrito, corrosão, desgaste, etc., torna-se possível, também, diminuir o consumo de energia, minimizar períodos de manutenção, poupar recursos não-renováveis, melhorar o desempenho de equipamentos, entre muitos outros benefícios. Alguns estudos, aliás, revelam um fabuloso potencial para efetiva redução de custos e consequente aumento na margem de lucro — só nos EUA, por exemplo, calcula-se que os custos gerados, direta e indiretamente, pelo atrito e desgaste de componentes e sistemas mecânicos ultrapassem os US$ 100 bilhões por ano (Blau, P. Tribology.). Não por acaso, a engenharia de superfície vem crescendo significativamente nas últimas décadas em vários países do mundo.

A "tribo" dos tribologistas ainda deve dar muito o que falar...

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Ficção superficial


Se duas bolhas de sabão forem colocadas uma junto da outra, muito provavelmente, elas se atrairão até um ponto de equilíbrio, e uma interface plana se estabilizará entre elas. Eventualmente, esta mesma interface pode se desestabilizar e se romper, fazendo com que ambas as bolhas se unam em uma única bolha maior, com a mesma quantidade de ar das duas anteriores. Mesmo sem considerar qualquer modelo físico formal envolvido no fenômeno, o resultado é bastante intuitivo, especialmente para quem já brincou com bolhas de sabão na infância. Imaginar que algo similar aconteça com porções sólidas, entretanto, causaria um certo estranhamento e seria perfeito para um belo filme de ficção científica.

Tente imaginar, por exemplo, duas metades de uma esfera metálica sendo colocadas uma junto da outra. Se elas não forem magnéticas, provavelmente não se atrairão, muito menos se unirão formando uma única esfera — pelo menos é isto o que diz nossa intuição. Porém, rigorosamente falando, não é bem isso o que deveria acontecer se as superfícies planas das duas metades fossem absolutamente lisas e estivessem isentas de quaisquer elementos ou substâncias (ar, água, etc.) entre elas. Ao uni-las, nessas condições ideais, os átomos mais externos de ambas as metades se religariam, fazendo com que as partes se tornassem, novamente, uma única esfera.

Na vida real, no entanto, mesmo a superfície mais lisa produzida, sempre apresentará alguma rugosidade — relevo formado por picos e vales de material —, impedindo que as superfícies se unam perfeitamente. Ao se pressionar duas partes metálicas, uma contra a outra, a área que efetivamente resiste à pressão é cerca de apenas 10% da área total de contato entre as superfícies. Além disso, vários elementos e substâncias se depositam ou se adsorvem nas superfícies expostas, o que também impediria que as ligações atômicas do material se refizessem, mesmo que as superfícies fossem idealmente lisas. Tudo isso mantém a reintegração de um corpo sólido, pela simples reunião de suas partes, ainda no campo da ficção.

Mas talvez alguém pudesse se perguntar por que um engenheiro se dignaria a estudar algo que, na prática, não acontece. É que, tal como tantas outras coisas na vida, a relevância de algo depende do ponto de vista que se assume. Os efeitos da rugosidade superficial tem um impacto menor nas aplicações estáticas do que nas dinâmicas, como será visto em uma futura discussão sobre tribologia.

Por enquanto, basta atentar para o fato de que ficção não é algo, assim, tão superficial...


quarta-feira, 31 de março de 2010

E o mundo não acabou...


Para a infelicidade dos apocalípticos, o mundo não acabou. A despeito das inúmeras elocubrações pseudo-científicas, o experimento de ontem, na Organização Europeia para Pesquisa Nuclear (CERN), não criou um buraco negro engolidor de realidades. Criou, sim, vários — com o perdão da precisão científica em favor do viés poético — buracos negros em miniatura, cujos resultados devem fornecer dados para inúmeras outras pesquisas futuras.

Segundo o portal de notícias G1, ontem, às 8:06 h (horário de Brasília), a equipe do LHC (monumental acelerador de partículas chamado de Grande Colisor de Hádrons, em inglês, Large Hadrons Collider) realizou o primeiro experimento bem sucedido com a colisão de prótons altamente energéticos, após mais de um ano de atraso. As partículas foram aceleradas a 99,99% da velocidade da luz (c = 300.000 km/s), atingindo uma energia recorde da ordem de sete trilhões de eletronvolts, nível energético próximo do que se acredita ter surgido no preciso momento da origem de nosso universo.

O LHC está localizado na fronteira entre a França e a Suíça e conta com um túnel subterrâneo de 27 km de extensão — onde as partículas são aceleradas por gigantescos eletroimãs — construído há cerca de 100 m da superfície. Possui vários detectores de sub-partículas elementares e custou, ao consórcio multinacional responsável por sua construção, cerca de três bilhões de Euros. Entre os objetivos — lógico, tão humildes quanto o investimento — estão o de simular as condições originais do "Big Bang", o de investigar outras dimensões além das três conhecidas (não há nada de místico aqui!) e o de encontrar provas experimentais do, atualmente teórico, Bóson de Higgs (aquele sobre o qual este autor disse que se recusava comentar) que explicaria o porquê de todos os corpos terem massa.

Um feito de tamanha superação humana, merece aplausos, independentemente das crenças, ou ausência delas, de cada um. Mesmo porque, se foi tão difícil simular apenas o estalo dos dedos de Deus, será, muito provavelmente, inviável, econômica e intelectualmente, destituí-Lo da criação do universo, não importando o quão próximo da realidade cheguem nossas teorias. Assim, não misturemos hádrons com bósons e continuemos, pacificamente, com nossa infinita busca pelo conhecimento.


sábado, 26 de dezembro de 2009

Vidros Metálicos?


Não há como negar a importância que os materiais exercem na existência dos seres vivos. Quando um pássaro usa uma fibra qualquer na fabricação de seu ninho, por exemplo, está, mesmo que inconscientemente, aplicando características estruturais de um material para sobreviver e perpetuar sua própria espécie. Com o ser humano, não poderia ser diferente.

Há mais de 6000 anos, o homem já dominava as técnicas fundamentais que constituem a base da metalurgia. A partir da chamada Idade dos Metais, a utilização dos materiais metálicos vem se diversificando a cada nova propriedade descoberta.

Na segunda metade do século passado, pesquisadores do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech) descobriram que se uma liga metálica fundida fosse solidificada suficientemente rápida e homogeneamente, seus átomos não teriam tempo ou energia para se ordenarem em um cristal, dando origem ao que foi chamado de vidro metálico.

Apesar de se tratar de uma liga metálica conhecida, este “novo” material possuía características bastante diferentes daquelas apresentadas por seu correspondente cristalino. Sem a ordenação atômica de um cristal, as propriedades mecânicas inerentes à existência e movimentação de defeitos cristalinos se apresentavam drasticamente diferentes. Citam-se, como exemplo, as elevadas resistência, dureza, tenacidade e elasticidade.

Estudando-se outras ligas, verificou-se também que a ausência de contornos de grãos — superfícies que separam duas regiões cristalinas, com átomos ordenados, distintas —, comuns nos materiais policristalinos, promovia maior resistência à corrosão e à abrasão. Nas ligas ferro-magnéticas, constatou-se uma maior resistividade elétrica e fácil magnetização e desmagnetização, minimizando as perdas elétricas em diversas aplicações.

A aplicação dessas intrigantes propriedades, entretanto, esbarrava em um problema prático: como atingir as taxas de resfriamento, da ordem de milhões de graus Kelvin por segundo, necessárias para se inibir a cristalização do metal?

A solução inicialmente encontrada foi a fabricação de vidros metálicos na forma de fitas, já que taxas de resfriamento tão altas só poderiam ser atingidas com pelo menos uma das dimensões — no caso a espessura — muitíssimo reduzida. A aplicação de tais produtos, entretanto, era demasiadamente restrita.

Muitas pesquisas foram realizadas, tanto nos processos de produção quanto no desenvolvimento de novas ligas metálicas com menor tendência a cristalização. Atualmente, já existem ligas metálicas que se solidificam em uma estrutura amorfa — não cristalina — com taxas de resfriamento bem menores que aquelas no advento dos vidros metálicos, possibilitando a obtenção de peças com dimensões de dezenas de milímetros.

Isso possibilitou o estudo mais aprofundado das propriedades e características dos metais amorfos, promovendo, consequentemente, novas aplicações desses materiais. Hoje já é possível encontrar ligas de vidro metálico sendo empregadas na composição de diferentes equipamentos.

Dado o alto custo de produção, a utilização ainda está restrita às áreas pouco sensíveis a preço como componentes para satélites, armamentos militares ou artigos esportivos de alto desempenho. Entretanto, com o domínio cada vez maior da tecnologia de processamento dos vidros metálicos, a tendência é de diminuição dos custos envolvidos, possibilitando seu uso em diversos outros campos da atividade humana.

Dentre as aplicações comerciais já encontradas atualmente, vale destacar os implantes cirúrgicos — devido às elevadas biocompatibilidade e resistência à corrosão — e os tacos de baseball ou golf, dada a eficiente transferência de energia mecânica proporcionada pelo material.

sábado, 19 de dezembro de 2009

Engenheiros de Aço


Dentre os muitos metais — cobre, alumínio, chumbo, estanho, magnésio, ouro, prata, platina, nióbio, tungstênio, ferro, antimônio, cromo, ligas como latão, bronze, etc. — sujeitos à capacidade de manipulação do metalurgista, um deles, o aço, é de longe o mais importante em volumes e aplicações. Talvez por isso, o aço esteja tão vinculado à profissão do engenheiro metalurgista a ponto de ser difícil, para alguns, vislumbrar a amplitude de sua atuação profissional. Desde as operações de refino do minério (atividade compartilhada com os engenheiros de minas) até as operações de montagem e acabamento (compartilhadas com os engenheiros mecânicos), há um vastíssimo campo de possibilidades para o emprego das competências dos engenheiros metalurgistas.

O aço, basicamente uma liga de ferro e carbono, foi o que deu vida à Revolução Industrial e, até os dias de hoje, desempenha um papel fundamental em toda a economia do planeta. A versatilidade é uma de suas principais características responsável por todo esse sucesso. Variando a composição química, o aço pode adquirir inúmeras propriedades diferentes, sendo que qualquer uma dessas composições, sob condições produtivas adequadas, pode assumir outras várias características, como maleabilidade, dureza, tenacidade, resistência, etc. Combinando-se composição e processamento, dá para se ter uma ideia das infinitas possibilidades de aplicação para o aço e o porquê dele ser tão largamente utilizado.

Já há algum tempo, a indústria automobilística vem se aproveitando dessa versatilidade para aumentar a eficiência ecológica dos seus veículos. Como boa parte da energia consumida por um automóvel serve apenas para locomovê-lo, ou seja, transportar sua própria massa, a diminuição de seu peso é o caminho mais natural para se obter um maior rendimento por litro de combustível consumido. Com esse propósito, os engenheiros foram chamados para realizar aquilo que melhor sabem: fazer mais com menos. Assim, muitas peças, inclusive da estrutura e lataria, foram substituídas por outras conformadas em chapas cada vez mais finas, diminuindo, assim, a quantidade de material utilizado — e, portanto, o peso das estruturas — ao mesmo tempo em que — surpreenda-se! — era melhorado o desempenho das antigas peças.

Isto só foi possível, entretanto, com o advento dos aços de alta e ultra-alta resistência que, ao contrário do que o senso comum poderia inferir, exibem tais níveis de resistência principalmente por causa de seu processamento diferenciado e não por grandes diferenças em sua composição química. Diversos passes de laminação — processo no qual o aço passa entre dois cilindros, tendo sua espessura reduzida — sob resfriamentos extremamente controlados, permitem obter chapas com resistências fora-de-série. Só para se ter uma ideia, uma chapa de aço carbono do tipo IF (Interstitial Free), comumente usado na lataria de um veículo (ou da sua geladeira), possui um limite de resistência da ordem de 300 MPa, enquanto que um aço de alta resistência multifásico (TRIP) pode atingir valores acima de 800 MPa, ou seja, mais do que o dobro.

A "mágica" fica por conta das várias fases — ordenações atômicas com propriedades distintas — presentes na mesma microestrutura do material. Diferente dos aços IF comuns, com basicamente uma única fase, os aços de alta-resistência possuem duas ou mais fases, permitindo que o material, ao se deformar, endureça segundo vários mecanismos simultâneos de endurecimento, o que o torna muito resistente, porém, não frágil — grosso modo, a fragilidade é uma contrapartida natural ao aumento de resistência.

Complexo, não? Mas tudo isso, como diriam meus colegas engenheiros, é apenas um infinitésimo de um mundo chamado metalurgia...

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Realidade Aumentada


Imagine se você pudesse sacar seu celular do bolso, apontá-lo para a paisagem urbana à sua frente e se, na imagem capturada pela câmera, aparecessem informações sobrepostas sobre estabelecimentos, produtos e serviços, em tempo real. Seria bem útil para um turista recém-chegado ao local, não? Este é um exemplo das inúmeras aplicações da realidade aumentada (RA) que, diferente da realidade virtual, integra elementos tanto virtuais quanto do mundo real para criar um ambiente misto, ampliado, no qual as informações são processadas em tempo real.

Para quem gosta de filmes de ficção, há uma infinidade de outros exemplos de aplicação, alguns, inclusive, já em uso. Óculos com projeção de alvos e ameaças, teclados projetados em superfícies, composição de imagens com base em modelos reais — como um objeto que, ao movimentar-se, tem seus movimentos reproduzidos no computador, animando uma imagem virtual —, dispositivos de camuflagem que projetam sobre um objeto as imagens que estão atrás dele, lentes de contato com projeção de informações diretamente na retina, sobreposição de imagens diagnósticas — radiografia, tomografia, etc. — ao corpo dos pacientes, e vários outros usos já escaparam do mundo ficcional para o real, muitos em fase final de pesquisas.

Aliás, o serviço descrito logo no início do texto já existe para os proprietários do Iphone 3GS ou dos "smartphones" com o sistema Android da Google. Basta baixar um programa gratuito chamado Layar para olhar através da câmera e encontrar os restaurantes, caixas-automáticos e outros serviços disponíveis nas proximidades. Infelizmente, parece que o serviço, hoje, só funciona nos países baixos, mas até o próximo ano deve chegar aos EUA, Alemanha e Reino Unido.

Dá até para imaginar, no futuro, esse tipo de coisa sendo usada para prevenir os desavisados cidadãos dos problemas provocados por obras na cidade, congestionamentos ou eventos de massa. Mas uma pergunta ainda fica no ar: será que, nesse futuro não muito distante, outros problemas "menores" já terão sido resolvidos ou o serviço também será ampliado para abranger essa realidade um pouco mais dura?