sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Engenharia Errada


Dizia uma infame anedota que os erros mais graves dos advogados permanecem ocultos no interior das celas, dentro dos presídios; os piores erros médicos, encontravam-se enterrados sob sete palmos de terra; os erros dos engenheiros, entretanto, estariam aí, à mostra, como grandes monumentos à imperfeição humana. Claro que a afirmação é absolutamente imprecisa e preconceituosa, bastando, para esta constatação, verificar que a maior parte dos advogados sequer trabalha na área criminal, a maioria absoluta das intervenções médicas são notadamente acertadas e há muitas outras áreas na engenharia além da civil. Seja como for, a frase também não causaria efeito algum, caso não contivesse qualquer coisa de factual.

Há alguns anos atrás, por exemplo, um professor de geografia explicava aos seus alunos — futuros advogados, médicos, engenheiros, etc. — que o território brasileiro não estava sujeito a grandes terremotos por se situar bem no interior da Placa Sul Americana, bastante espessa e estável. Dizia, também, que, na eventualidade de um fenômeno sísmico de proporções ainda não observadas, as características geológicas de cada região seriam o principal indicador das áreas com maior potencial de risco às estruturas humanas construídas sobre sua superfície. Uma dessas zonas mais suscetíveis, esclarecia ele, ficava na divisa entre os estados do Rio de Janeiro e São Paulo, justamente onde engenheiros estrangeiros — que, obviamente, desconheciam as peculiaridades da geologia nacional — contratados pelo então regime militar concluíram ser a melhor localização para se construir as primeiras usinas nucleares brasileiras. Note que o "erro" é relativo, pois se por um lado a região sudeste, maior centro populacional brasileiro, passou a ser ameaçada pelos efeitos de um eventual desastre nuclear, por outro, Brasília, núcleo de todo comando político-militar nacional sempre esteve bem protegido no interior do Brasil.

Assim, é um tanto complicado se falar em erro quando profissionais e dados envolvidos em uma análise de engenharia estão, quase sempre, incompletos ou viciados por questões outras, além das meramente técnicas — e qualquer engenheiro com um mínimo de experiência na sua área sabe bem disso. Não foi um erro de engenharia que levou à perda de muitíssimo mais vidas no Haiti do que no Chile por ocasião dos recentes grandes terremotos americanos, senão outras causas, como a condição social, político e econômica distinta de cada uma dessas regiões. O mesmo se pode dizer de eventos menos globais como o desabamento durante a construção de uma nova estação do trem metropolitano de São Paulo, a queda de vigas de um viaduto no trecho sul do anel viário paulista e a crônica insuficiência da malha ferroviária urbana para atender a população nos horários de pico que, mesmo com linhas absolutamente novas e ainda não totalmente funcionais, já se mostram completamente saturadas — apesar de nunca aparecerem assim nas campanhas publicitárias custeadas com dinheiro público, mas que servem à divulgação de setores privatizados.

Mas se a teoria da tectônica de placas prevê que um grande terremoto pode, inclusive, mudar o eixo de rotação terrestre, gerando uma série de efeitos para a vida no planeta, por que um terremoto social não seria capaz de alterar o eixo político e extinguir, de uma vez por todas, esses anedóticos "erros" de engenharia?


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