sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Eles sabem o que é melhor para a gente II


Assim que descobre o efeito colateral do emplastro, você tenta retirá-lo, mas ele não sai. Vai, então, até o banheiro e, em frente ao espelho, tenta novamente. Dói à beça, mas o adesivo acaba saindo, junto com a pele do local. Mais aliviado que dolorido, joga tudo fora — enquanto xinga a mãe de quem inventou o tal emplastro — e vai dormir. Só que no dia seguinte, de tão exausto, nem consegue se levantar e quando, instintivamente, põe a mão no ferimento que não parava de arder, descobre, chocado, que o emplastro ainda continuava lá, grudado no mesmo lugar.

Você reúne o que lhe resta de suas forças, corre novamente para a frente do espelho e o arranca, de novo, dessa vez urrando de dor — as cabeças da mãe do criador do emplastro e do gerente do banco já não são mais suficientes para aplacar sua ira. Então, você se arrasta até a cozinha para tomar café, mas logo percebe que o emplastro apareceu grudado no mesmo lugar outra vez! Sem entender nada, corre para acessar o Google e descobrir como se livrar daquele inconveniente. Acha uma porção de coisas, tenta de tudo e, mesmo assim, não consegue se livrar do maldito emplastro — as recomendações que encontrou se tratavam de versões anteriores e o gerente do banco teve o cuidado de lhe entregar a última novidade.

Aquilo se torna uma questão de honra e você começa a pesquisar mais sobre o assunto, tentando absolutamente tudo, tanto o que leu quanto o que não leu. Como resultado, algumas vezes você desmaia e outras acha que morreu definitivamente, e sempre que recobra a consciência, descobre que o emplastro continua no lugar, firme e forte. Você luta, sozinho, bravamente contra aquele abuso, já que seus recursos financeiros já não mais permitem contar com auxílio profissional especializado — como última alternativa, deixa um guru indiano de sobreaviso para transferir sua alma a outro corpo, caso alguma fatalidade irreversível aconteça.

Finalmente, depois de meses, desde que se iniciaram os desagradáveis sintomas, você consegue se livrar da praga definitivamente. Não sem antes fazer coisas inimagináveis com o próprio corpo, coisas que jamais ousaria tentar em situações convencionais. Veio a saber, nesse ínterim, que o maldito emplastro usava uma tecnologia de integração gênica, praticamente impossível de ser dissociada do corpo da pessoa por métodos comuns. O mecanismo, furtivo como um virus, funcionava de forma a se reconstituir, indefinidamente, nem que para isso tivesse de sacrificar o próprio hospedeiro.

E você, então, pensa, por um instante, sobre o que fazer com relação ao banco, ao gerente e aos criadores de tamanha aberração, mas se lembra que a instituição bancária, com seu infinito poderio jurídico, é inatingível pelas leis de seu país e que, da mesma forma, tal proteção da justiça, inevitavelmente, também se estenderia ao gerente do banco e aos criadores do emplastro, haja vista todos estarem legalmente constituídos. Por fim, vislumbra uma certa descrença pela humanidade, conforma-se com sua própria insignificância e decide fazer a única coisa que lhe resta: contar sua história em um "blog" para que outras pessoas também possam ser alertadas.


Nenhum comentário:

Postar um comentário