sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

O Bêbado


"E o bêbado continuava lá a alegar que todo mundo ria dos tombos dele, mas ninguém via as pingas que ele tomava. Os sóbrios gargalhavam de perder o fôlego e os demais, ainda que sorridentes, prestavam pouca atenção ao discurso etílico do colega.

Em um dado momento, alguém arriscou perguntando ao bêbado o porquê dele estar dizendo aquilo para uma platéia tão pouco amistosa. Ele tomou mais um gole do que estava no copo, soluçou e disse que era exatamente porque a platéia não era amistosa. Disse, também, que eles precisavam ouvir umas coisas e que lamentava o fato da sobriedade de alguns embriagar mais do que o álcool que ele ingeria. Emendou, ainda, dizendo que ele próprio se curaria depois de uma noite de sono, mas que não seria assim tão fácil com a maioria ali. Muitos voltaram a rir.

O mesmo que perguntara da primeira vez, tornou a se dirigir ao ébrio cidadão, dizendo que ele tinha bebido demais, que já não articulava coisa com coisa e que era melhor ele ir para casa. O bêbado, entretanto, encarou-o com um olhar cambaleante, mas sério, e disse que aquilo vinha se tornando cada vez mais comum. Que as pessoas só olhavam para a quedas dos outros e riam e ninguém questionava nada ou mesmo ofereciam ajuda. Que apenas riam, nada mais. Menos gente riu, dessa vez...

O bêbado tomou o último gole e ficou por uns segundos beijando a borda do copo como que para não desperdiçar nem uma gota sequer. Largou-o no balcão, meneou com a cabeça olhando para o dono do bar que o respondeu com gesto similar e olhou com uma espécie de desprezo para os que ainda riam olhando para ele. Encaminhou-se lenta e erraticamente para a saída, mas ao tentar descer o degrau, esborrachou-se no chão.



E todo mundo gargalhou de novo."

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