Qualquer cidadão ético, minimamente instruído, jamais compraria um número de sua própria rifa. E mesmo se fosse obrigado a fazê-lo, como no caso de não ter conseguido vender todos os números, tomaria uma série de precauções para garantir que o máximo possível de pessoas, especialmente de compradores com quem não mantém uma relação mais próxima, pudesse acompanhar o registro dos números faltantes e a apuração do resultado final. Faria tudo isto para garantir, de todas as formas possíveis, a lisura e a transparência do processo. Qualquer cidadão ético, minimamente instruído, sabe que, mesmo estando, ele próprio, absolutamente ciente da própria honestidade, quando há outras pessoas envolvidas, deve, além de possuir, também demonstrar sua retidão aos demais. Sabe que qualquer ato pouco transparente, ainda que involuntário, pode levantar suspeitas sobre suas intenções. Algumas instituições públicas no Brasil, entretanto, parecem não entender muito bem este princípio.
Pelo mesmo motivo do cidadão acima descrito, qualquer empresa privada, ao realizar uma promoção comercial, costuma estabelecer como regra precípua que nem seus funcionários, nem membros das partes organizadoras, participem do processo. Já em algumas instituições públicas, até hoje se mantêm o péssimo costume de — como se diz por aí — "colocar raposas para tomar conta dos galinheiros". Ao "sumir algumas galinhas", os responsáveis pela incompreensível situação ainda se indignam por terem a licitude de suas ações questionadas por um ou outro desavisado observador. Sabe-se que a grande maioria dos concursos públicos no Brasil são absolutamente lícitos e a transparência de seus procedimentos não deixam espaço para quaisquer questionamentos. Há outros, entretanto, que, quando não são alvos de fraudes declaradas, testam todos os limites das leis e normas existentes para, entre elas, encontrar formas de, digamos, flexibilizá-las.
Em meados de julho, a Polícia Federal indiciou 80 suspeitos por fraudar concursos públicos, entre eles, segundo a Folha de São Paulo de 16/07/2010, a segunda fase do exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em março deste ano, a prova para agente de Polícia Federal de 2009 e o concurso de auditor da Receita Federal de 1994. Neste ano, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) vem tentando explicar ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) as razões de uma série de procedimentos deliberados pela instituição que acabaram culminando no pedido de impugnação do último concurso para magistrados substitutos no qual pouco mais de 20% dos aprovados foram confirmados, pelo próprio TJ-MG, como sendo familiares dos magistrados — inclusive do presidente da casa — e de demais membros do tribunal. Há alguns anos atrás, fortes rumores davam conta de que uma autarquia paulista teria aberto concurso público para, veladamente, regularizar a situação de alguns se seus trabalhadores mas, a falta de provas por parte dos candidatos e a nenhuma vontade dos orgãos competentes de investigar o certame, enterraram as eventuais irregularidades.
Com tudo isso, talvez fosse válido mencionar que o simples questionamento fundamentado de um concurso público é, data venia (como diriam os juristas), mais do que o suficiente para evidenciar que, no mínimo, não houve, por parte da organização, a transparência necessária.
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