"A garota finalmente chegara para mais uma de suas diárias sessões de exercícios na academia. Atrasada, correu para o vestiário, trocou-se rapidamente e quando seguiu em direção aos aparelhos, seus velhos companheiros de quase todas as noites, o atendente a barrou:
— Desculpe-me, mas posso ver seu exame médico, senhora?
— Ah, tem isso agora?
— Sim, senhora! O item 1, alínea 3, do contrato de admissão é bastante claro: '... o livre uso dos equipamentos da academia fica condicionado à apresentação prévia de exame médico válido, emitido por esta instituição ou por profissional habilitado no Conselho Regional à escolha do frequentador.'...
— Ah, sim, é mesmo! Eu já entreguei quando me inscrevi, há algum tempo atrás.
— Mas a senhora o renovou no último ano?
— Não, acho que não...
— Então, sinto muito, senhora, mas não poderá usar os equipamentos enquanto o exame não for renovado.
— Mas eu venho aqui todo santo dia e nunca precisei disso...
— Desculpe-me, senhora, mas são as regras. A empresa começou a fiscalizar este item com maior rigor para segurança dos próprios usuários...
— Não, não tem problemas! Eu me responsabilizo, caso venha sofrer uma síncope!
— Impossível, senhora, sinto muito...
A garota saiu chutando a sombra e maldizendo, mentalmente, três gerações da família do, ou da, burocrata responsável pela perda de sua noite de exercícios. No dia seguinte, saiu mais cedo do escritório, passou no médico da própria academia para que não houvesse a menor possibilidade de questionamento quanto à validade do exame e seguiu pisando firme em direção ao funcionário da noite anterior. Entregou-lhe o papel, que foi arquivado em sua pasta pessoal, sem sequer ser lido, e ouviu o agradecimento e as boas-vindas do rapaz. Assim, seguiu tão decidida para a bicicleta ergométrica que sequer percebeu o haltere jogado no chão — situação comum desde a última troca da empresa terceirizada de limpeza e arrumação. Tropeçou, caiu e bateu com a têmpora direita na quina de aço do aparador de pesos. Não houve, sequer, tempo para o socorro.
No dia seguinte, a empresa se lamentou, publicamente, pela fatalidade e reiterou sua constante preocupação com a saúde e a segurança de seus clientes, apresentando a vasta relação de itens que requeria deles antes de permitir o acesso às suas instalações."
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