terça-feira, 17 de agosto de 2010

A pedra


"O rapaz ia pisando firme pelo caminho, irado com os últimos acontecimentos em sua vida. Poucas coisas vinham ocorrendo da forma como ele, tão cuidadosamente, havia planejado e, não bastasse isso, os revezes ainda pareciam assumir propositadamente — como se isto fosse plausível — a pior configuração possível. E por mais que pensasse, não conseguia entender como tudo aquilo podia estar acontecendo. Tampouco podia se ver como responsável por qualquer uma daquelas dificuldades. Suas simulações mentais teimavam em apontar sempre um ou outro culpado pelos dolorosos percalços que vinha enfrentando. Afinal, como poderia, ele, ter previsto ações, assim, estapafúrdias de outrem.

Tão entretido estava com sua ruminação mental que não percebeu uma pedra que se aproximava. Topou com ela, caiu e se feriu em várias partes do corpo. Levantou de supetão, esbravejou, gritou, esperneou, chutou a pedra, cobriu-a com todos os impropérios conhecidos, enfim, extravasou todo o sentimento reprimido ao longo dos últimos dias. A pedra, como é do feitio das pedras, permaneceu ali, apenas, calada e inerte, sem esboçar a mínima alteração, até que a última gota de ódio do rapaz tivesse sido destilada contra ela. Cansado, ele se deixou cair sobre os próprios joelhos, começando a chorar.

Depois de alguns minutos, já recomposto, embora ainda dolorido, levantou-se e olhou para a pedra que, inabalável, permanecia exatamente no mesmo lugar. Aquela passividade, por um instante, remeteu-o a si mesmo e acabou por se arrepender profundamente de sua perda de autocontrole. Compreendeu, então, a lição que aquela pedra lhe ensinava: não importaria o que fizesse, nada poderia atingi-la. Mesmo que a destruísse, ela jamais deixaria de ser uma pedra por causa disso. Logo, fez como se pretendesse agradecer o ensinamento e seguiu seu caminho, agora bem mais calmo.

Já a pedra, sequer ameaçou se mover...
"

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