Neste último final de semana, aconteceu a prova do ENEM. Lembra?! Aquela prova que foi adiada depois que uns gaiatos resolveram fazer um pé-de-meia vendendo as questões... Se não se lembra, pode dar uma olhadinha em "E... Nem...", quando escrevi algo sobre o episódio.
Curiosamente, não sei se de propósito ou não, o tema da redação foi: "O indivíduo frente à ética nacional". Achei que daria um ótimo tema para uma postagem por aqui também, assim, preparem-se! Só espero que nenhuma das professoras de redação me corrija...
Ética é algo que só o ser humano possui. Animais não possuem ética. Plantas não possuem ética. Virus e bactérias não possuem ética. São aéticos, ou anéticos. Não porque sejam vis, ou algo assim, mas, simplesmente, por não apresentarem a mesma capacidade de julgar e decidir que os homens e as mulheres possuem. À exceção destes que leem, todos os demais seres vivos no planeta Terra agem apenas por instinto — pelo menos a priori.
É justamente o discernimento que nos faz humanos e, com base nele, relacionamo-nos. A ética surge daí, de um conjunto de princípios em que o indivíduo se baseia para decidir sobre sua própria conduta e, assim, bem conviver com seus pares. As leis, códigos e preceitos apenas mostram o caminho de uma ética comum adotada por um povo ou um determinado grupo de pessoas, não sendo, porém, imanentes à ética. Isto significa que é o indivíduo quem deve moldar sua ética para que possa pertencer a uma determinada coletividade. Como exemplo disso, pode-se citar, talvez, a ética dos criminosos nos presídios.
Portanto, parodiando um conhecido adágio — mas mudando a parte do corpo humano para não ser deselegante —, "ética é como cabeça, todo mundo tem uma". A dificuldade está em fazer convergir várias éticas para uma ética comum, visto que esse movimento só pode partir do indivíduo e de ninguém mais.
Ao contrário de uma "lei" física que impõe uma impossibilidade — como a de dois corpos não poderem coexistir no mesmo lugar do espaço —, as leis humanas servem apenas para "orientar" as pessoas na busca por sua própria ética, alinhando-a à ética vigente na sociedade. Segundo as leis brasileiras, por exemplo, o roubo é punido com alguns anos de cadeia, mas, a depender das condições, da interpretação do magistrado e até da ausência do ladrão, pode ser que nada aconteça. Somente o indivíduo possui o verdadeiro poder sobre suas próprias ações, o resto é contingência.
Sendo assim, talvez a conduta ética comum devesse ser incluída como disciplina obrigatória já na pré-escola, para que o indivíduo tivesse claro, o quanto antes, que, ao longo de toda sua vida, a privação de alguns desejos seus será necessária para o bem de si e de seus semelhantes. Kant já explicitava essa idéia quando escrevia que as pessoas deveriam sempre avaliar se uma dada ação poderia, ou não, ser convertida em universal, ou seja, se todos os outros também poderiam agir da mesma forma. A negativa ao questionamento era sinal de que a ação fugiria a uma ética comum aos seres humanos. Analogamente, Mário Sérgio Cortella, um filósofo brasileiro, sugere, também, perguntar-se, antes de agir, se quer, pode e deve, não levando a cabo a ação se qualquer das respostas for negativa. Além disso, alerta que não possuir dilemas éticos é um indício de que algo vai mal.
Depreende-se de tudo isso que é, principalmente, com respeito e os bons exemplos de cada um que a ética nacional deverá mudar, acabando com ladrões de prova, guardadores de dinheiro em roupas íntimas, fraudadores de imposto de renda e estacionários jovens das vagas para idosos. A solução reside no íntimo individual de cada cidadão, ou cidadã, e não nas leis, na indignação inerte ou no "apontar de dedos". Porque, adaptando o que diz Calligaris em seu texto na proposta de redação, indignar-se só com os outros e com o mundo, "serve apenas para 'confirmar' a 'integridade' de quem se indigna", mas não contribui com a ética de seu povo.
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