“O coração tem razões que a razão desconhece.” (Blaise Pascal, filósofo francês do século XVII)
Supostamente, é a partir da rara união entre duas “genéticas” tão distintas, quanto a da razão e a da emoção, que se forma o embrião quimérico da consciência humana. Mas, independentemente de serem diferentes ou não, formam um ser único que não mais poderá prescindir de uma ou outra para existir. Seria um erro, portanto, presumir que alguém mais propenso à racionalidade, ou às emoções, fosse melhor ou pior que seus semelhantes. Ambas as características são necessárias e esta indissociabilidade entre razão e emoção, ponto chave para uma adequada compreensão da natureza humana, constituirá o eixo central da argumentação deste texto.
Recentes avanços na área da neurobiologia veem correlacionando certas regiões cerebrais ligadas a cada um dos processos mentais da mente humana. Muitos desses estudos são realizados comparativamente com animais — o que, de certa forma, limita os possíveis resultados — e outros com pacientes humanos que sofreram lesões cerebrais. Um dos primeiros casos relevantes estudados foi o de Phineas P. Gage, ricamente descrito por António R. Damásio em seu livro O Erro de Descartes (DAMÁSIO, A. R. O erro de Descartes: emoção, razão e o cérebro humano. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.).
Gage era um capataz da construção civil, à época, em 1848, com 25 anos de idade, que, ao substituir um de seus homens nas obras da Estrada de Ferro Rutland & Burlington em Vermont, Nova Inglaterra, sofre um grave acidente de trabalho que lesa seriamente o lobo frontal de seu cérebro. Ao calcar, acidentalmente, uma carga de pólvora na rocha, provoca uma explosão que arremessa sua ferramenta, uma barra cilíndrica de ferro com cerca 100 x 3 cm, há mais de 30 m de distância do local, não sem antes trespassar o crânio de Gage. A barra havia entrado pelo lado esquerdo de sua face e saído pelo topo de sua cabeça, entretanto, contra todas as expectativas, ele não apenas sobreviveu ao acidente, como também se manteve consciente a ponto de explicar os detalhes do ocorrido ao médico que lhe atendeu.
Cerca de dois meses mais tarde, Phineas P. Gage já havia se recuperado, mas não era mais o mesmo. Apesar de sua recuperação física ter sido completa — apenas a perda da visão do olho esquerdo lhe sobrara como sequela —, seu comportamento foi drasticamente alterado. Sua personalidade, antes socialmente louvável, depois do acidente se tornou irreverente, indolente, desrespeitosa, volúvel e extremamente prejudicial ao seu convívio social. Também sua capacidade de se emocionar e tomar decisões fora prejudicada. Estudos posteriores revelaram que a alteração de seu comportamento havia se dado pela lesão que sofrera naquela região cerebral específica.
Nenhum comentário:
Postar um comentário