sábado, 29 de maio de 2010

Sociologia de boteco


E aproveitando o clima descontraído de bate-papo, nada melhor do que propor uma tese sociológica elaborada, daquelas que requerem boas horas de discussão, em meio a petiscos e aperitivos, para serem adequadamente digeridas pelo consciente da galera. E não a prejulgue pela boemia no momento de sua concepção, pois são justamente tais condições que costumam favorecer o aparecimento dos germes primordiais que originam ideários extremamente complexos. A história mostra, aliás, que tais desenvolvimentos podem marcar, profundamente, a humanidade — não que este seja um desses casos. Basta recordar quantos partidos políticos, sociedades secretas e tantas outras organizações sociais surgiram de despretensiosas conversas em torno de uma mesa de bar.

Pois bem, a tese de que trata esta postagem não nasceu, exatamente, em um bar, mas na mesa de um restaurante, durante a hora do almoço. Conversava-se sobre algumas das mazelas mais comuns na sociedade moderna, tais como as várias facetas da violência, a degradação do meio-ambiente pela ação do homem, a corrupção nas mais diversas instituições públicas e privadas, etc. De repente, surge o "insight" que daria origem a toda a tese: as ações de controle e reparação são, geralmente, focadas nos efeitos e, raramente, nas causas de tais mazelas. Claro que esta é uma visão determinística, idealizada, pois nem sempre um fato social tem uma causa bem definida, mas, não há como negar, que certas condições — ou combinação destas — favorecem, em maior ou menor grau, determinados padrões de comportamento na sociedade.

Pretender lidar com um problema social apenas com a mitigação de seus efeitos é quase como, desejando se livrar das dores, tratar um infarto do miocárdio apenas pela ingestão de analgésicos. Há que se compreender o fenômeno com maior profundidade para que seja possível adotar medidas eficazes na condução do presente ao futuro desejado. A atitude mais comum, entretanto, é, justamente, o direcionamento de escassos recursos para minimizar os efeitos e não as origens do problema.

Tomando-se a violência como exemplo, note que a solução vai muito além da mera repressão de certos comportamentos. Pode até parecer estranho à primeira vista, mas a atitude violenta que ceifa a vida de alguém em uma discussão na rua possui a mesma origem daquela que encerra a carreira de um profissional durante uma vaidosa demonstração de poder em um ambiente corporativo. Embora os efeitos sejam absolutamente diferentes, a natureza das violências é a mesma. E, ao invés de se criar mecanismos para impedir que o efeito se manifeste, como aumentar o contingente de policiais nas ruas ou burocratizar excessivamente os processos de recursos humanos, por que não investir esforços na redução — ou, pelo menos, no controle — da "natureza violenta" no ser humano? Verifica-se o mesmo padrão também nas diversas medidas anti-corrupção, leis contra intolerância, etc.

E a hipótese para explicar o porquê desta "tese" nunca ter saído do campo sociológico dos botecos é, simplesmente, a de que seu estudo é inviabilizado, em ambientes mais "sérios", pelos elevados níveis de humildade e auto-crítica demandados no processo.

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