quarta-feira, 7 de julho de 2010

Inversões Científicas


Quem não fugiu das aulas de ciências na escola deve se lembrar da variação de temperatura segundo a altitude — quanto mais alto, mais frio. E mesmo os que detestavam a disciplina devem saber ao menos, quase instintivamente, que a média de temperaturas em uma cidade no alto da serra — como Campos do Jordão no interior paulista — costuma ser menor do que uma cidade litorânea em uma latitude similar — como Santos, por exemplo, também no litoral do estado de São Paulo. Isto se deve, em grande parte, ao efeito da pressão atmosférica que é maior no nível do mar — recordando: para um volume de ar constante, a pressão é diretamente proporcional à temperatura (P=T·cte), ou seja, quanto maior a pressão (mais baixo), maior deve ser a temperatura. Bom seria se tudo fosse, assim, simples como a equação dos gases ideais...

Ironias à parte, a variação da temperatura com a altitude é a base de um fenômeno atmosférico comum no inverno paulistano: a inversão térmica. Ela ocorre quando uma camada de ar quente fica acima de outra, mais fria, próxima à superfície terrestre, impedindo a convecção natural que dispersa os poluentes, infelizmente, tão comuns às grandes cidades. O problema, a princípio, pode ocorrer em qualquer época do ano, mas é agravado — e, portanto, mais percebido — durante o inverno por causa das estiagens prolongadas. Assim, altas concentrações de monóxido e dióxido de carbono, enxofre, ozônio, poeira e uma infinidade de outras substâncias tóxicas transformam a vida de milhares de pessoas em um pesadelo alérgico, aumentando sobremaneira as internações e mortes por complicações respiratórias.

Quem teve a oportunidade de voar, hoje, pelo céu de São Paulo, pôde ver uma espessa camada de poluição cobrindo toda a cidade, assustadoramente escura e densa. Uma clara — ou, com perdão do trocadilho, escura — visão do que vai pulmão adentro dos milhares de pessoas nestes dias. E enquanto São Pedro não resolve dar aquela necessária enxaguada celestial, talvez fosse o momento de refletir no que vem sendo feito para, pelo menos, minimizar o problema. Definitivamente, o problema não vai se resolver com o contínuo aumento da frota de veículos automotores à combustão rodando por aí, nem com a diminuição das áreas verdes nos centros urbanos para a construção de belíssimas avenidas asfaltadas cujo tráfego é saturado tão logo são inauguradas — quanto menor a área verde disponível, menor a umidade próxima ao solo e mais rápido é o resfriamento da camada de ar adjacente, aumentando a probabilidade de ocorrência da inversão térmica.

Por outro lado, talvez o fato de São Paulo, até hoje, não possuir uma linha férrea interligando os três principais aeroportos do estado, por exemplo, tenha seu lado pró-ambiental, afinal, um único avião em uma única viagem pode lançar mais poluentes na atmosfera do que o uso anual de qualquer veículo automotor à combustão altamente poluente. Não fossem o deficit logístico histórico e os altos pedágios das exemplares vias paulistas, talvez o acréscimo gerado no setor aéreo — e na economia, em geral — tivesse produzido maiores danos ambientais ainda.

Notou como há coisas muito mais difíceis de se entender — e de explicar — do que a matéria das saudosas aulas de ciência sobre a termodinâmica dos gases perfeitos e suas consequências meteorológicas? O conceito de sustentabilidade é um exemplo típico disso!

Nenhum comentário:

Postar um comentário