quinta-feira, 1 de julho de 2010

O Encontro


"Ajeitou a camisa e se olhou no espelho como que por reflexo, já que sequer notou a mancha de creme dental no colarinho. Dirigiu-se apressado para a porta. Já estava atrasado e não poderia mais adiar aquele encontro, afinal, era a terceira vez que o remarcava e não saberia como fazê-lo mais uma vez. Havia algum tempo que vinha adiando o momento repetidamente. Pensara durante toda a noite nas ocasiões anteriores e chegara à conclusão de que se tratava de uma espécie de auto-boicote. Evidentemente, não era algo perceptível no nível da consciência, mas bastou uma única e corajosa reflexão para entender todo o mecanismo: o inesperado incidente com o carro, a hora-extra no trabalho e até aquela batida policial na qual foi parado... Tudo, agora, fazia sentido.

Calçou os sapatos, colocou os objetos pessoais no bolso, bateu a porta e quis trancá-la tão rápido que a chave travou na fechadura. Após algumas tentativas infrutíferas de soltá-la, usou a blusa que carregava nas mãos como proteção e tentou girar com toda a força que dispunha, ao que a chave acabou se quebrando. Verificou a maçaneta e notou que a porta, pelo menos, estava trancada. Guardou o pedaço da chave no bolso e correu para a garagem, pensando que após consumado o encontro resolveria aquilo, nem que precisasse passar a noite na casa de algum conhecido. Estava decidido a não deixar que nada o impedisse de cumprir com sua palavra novamente.

Deu-se por falta da chave do carro apenas quando nele chegou. Revirou a carteira, os bolsos, mas nada; a chave do carro havia, provavelmente, ficado no seu mais costumeiro lugar, ou seja, sobre o aparador da sala-de-estar. Começou a desesperar-se com o exíguo tempo disponível. Pensou em várias possibilidades de como entrar novamente na residência, mas não encontrou nada que fosse viável em tão curto período. Correu, então, para a rua em busca do primeiro transporte que encontrasse e viu o ônibus virar a esquina. Procurou por um táxi, mas não havia sinal deles em nenhuma das ruas do quarteirão. Sentou-se, por fim, no meio-fio, sacou o celular e ligou para desmarcar o encontro pela quarta vez.

Alguns minutos depois, um chaveiro conhecido apontava ao final da rua...
"


Nenhum comentário:

Postar um comentário