Ontem fez vinte anos que a lei 8.069 de 13 de julho de 1990 instituiu o Estatuto da Criança e do Adolescente no Brasil. A lei foi concebida com base nas diretrizes da atual Constituição Federal de 1988, englobando uma série de normativas internacionais definidas pela Organização das Nações Unidas, antes mesmo de sua vigência se tornar obrigatória. O estatuto trata dos direitos fundamentais das crianças (pessoas de até 12 anos incompletos) e adolescentes (de 13 a 18 anos incompletos), além dos órgãos e procedimentos com eles relacionados. Com a legislação, também foram criados mecanismos de proteção nas áreas de educação, saúde, trabalho e assistência social.
Por ocasião da data comemorativa, o Executivo anunciou que encaminharia, hoje, um projeto de lei para ser discutido no Congresso Federal, alterando a lei 8.069/1990 de forma a coibir o emprego de quaisquer tipos de castigos físicos (tapas, beliscões, puxões de orelha, etc.) contra crianças e adolescentes, mesmo que para fins pedagógicos. Apelidada de "Lei da Palmada", a alteração visa acabar com o uso da violência física na educação infantil. A ideia não é nova, já que desde 2003 tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 2654, de semelhante teor, da Deputada Federal Maria do Rosário, aprovado em caráter conclusivo por todas as comissões, mas que, devido a recursos, aguarda discussão e votação em plenário desde 2006.
O tema, extremamente polêmico, tem suscitado calorosas discussões entre os favoráveis ao "direito" dos pais baterem em seus próprios filhos e os adeptos da completa ausência de violência na educação infantil. Nos debates, as abordagens percorrem um amplo espectro de questões que vão das estritamente técnicas — se o Estado poderia ou não legislar sobre o assunto, por exemplo — até as de cunho pessoal — como as que envolvem a manutenção de tradições familiares violentas. De modo geral, entretanto, ambos os lados possuem um mesmo objetivo: criar crianças e adolescentes de forma a torná-los adultos melhores para a sociedade. A divergência é apenas com relação ao método mais adequados para se atingir esse objetivo.
A discussão que se travará no plenário — algo que já deveria ter acontecido, diga-se de passagem — será bastante útil para dirimir os principais pontos discordantes a respeito do problema. Mesmo porque, ainda que a violência, de maneira geral, seja considerada danosa à formação do indivíduo pela maioria dos especialistas, nacionais e internacionais, não se pode deixar de levar em conta, também, os efeitos que a implementação dessas alterações causará em boa parte da sociedade, já que, infelizmente, ainda há muita gente que não conheça outra forma de educação sem o uso da agressão física (ou psicológica). Assim, a criação de mecanismos eficientes e acessíveis a que os pais possam recorrer quando em face de situações limites no decorrer da educação de seus filhos pode ser tão necessário quanto apenas puni-los pelo uso de "violência moderada".
A polêmica não deve amainar tão cedo, afinal, como Mahatma Gandhi deve ter percebido ao longo da vida, embora plenamente possível, mudar certos padrões sociais de pensamento não é algo, assim, tão trivial.
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