segunda-feira, 7 de junho de 2010

A sabedoria do não-saber


Terça-feira passada, 1º de junho, o jornal Folha de São Paulo veiculava uma notícia sobre o gradual desaparecimento da faixa de areia na Praia da Armação, em Florianópolis. O texto chamou a atenção por vários motivos: primeiro por se tratar de um lugar maravilhoso (conforme anteriormente comentado por aqui em "Santa Catarina: se quéis, quéis. Se não quéis, diz..."), segundo porque se tratava de um problema ambiental e social, terceiro porque, apesar de não ser aparentado, o especialista citado na reportagem tinha o mesmo sobrenome deste autor que aqui escreve e, por último, porque a divergência entre os pontos de vista do especialista e da administração pública local ilustra bem um problema bastante comum nos dias atuais e que, supostamente, não deveria ocorrer.

Um estudo realizado pelo geólogo Rodrigo D. O. Sato, presidente da Associação Profissional dos Geólogos de Santa Catarina, apontou como causa do estreitamento da faixa de areia na Praia da Armação a expansão, ocorrida há sete anos, de uma barreira de pedras construída na foz de um rio local. Baseando-se em análises dos registros fotográficos e cartográficos do local, obtidos nos últimos 70 anos, Sato diz que a ação humana foi a responsável pelo fenômeno e aponta, como evidências de sua conclusão, casos similares em praias ao norte da Ilha de Santa Catarina e o efeito inverso constatado na praia ao lado, do Matadeiro, que vem aumentando sua faixa de areia no mesmo período. Nas últimas semanas, uma ressaca marítima cobriu a extensão da Praia da Armação, Pântano do Sul, destruindo cinco casas e danificando outras trinta. O trabalho do geólogo foi entregue à Defesa Civil e a prefeitura local foi informada, porém, ninguém se manifestou sobre remover parte da barreira de pedras, voltando à condição de sete anos atrás.

O secretário de obras de Florianópolis discorda das conclusões do trabalho por ter ouvido, segundo ele, vários engenheiros afirmando coisas diferentes. Disse que a prioridade é evitar a contaminação por sal da Lagoa do Peri, no interior da Armação, devido ao avanço do mar, já que o reservatório abastece cerca de 100 mil habitantes na região. A prefeitura, também, já iniciou a construção de um muro de 1,75 km para proteger as casas e cogita usar dragas para aumentar a faixa de areia da praia.

Não que o Secretário de Obras ou a prefeitura tivessem de, necessariamente, concordar com o estudo realizado pelo especialista, mas simplesmente discordar, sem qualquer outro embasamento técnico a não ser "opiniões" de outros "profissionais", parece um tanto arrogante para pessoas e instituições que servem a um sistema democrático. E esta é uma atitude comum, não apenas em instituições públicas, mas também em empresas privadas e pessoas, individualmente, todos incapazes de admitir as próprias limitações — diga-se de passagem, absolutamente normais. No caso citado, por exemplo, se as conclusões do estudo estiverem corretas — o que parece razoável, haja vista se tratar de um problema geológico estudado por um geólogo —, escassos recursos públicos e tempo valioso estão sendo, irremediavelmente, perdidos.

Saber que não se sabe tudo, no entanto, é uma sabedoria que poucos acabam adquirindo ao longo da existência, infelizmente...


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